André Cabral – Historiador e professor

Quando falamos no Haiti, lembramos da letra da música dos compositores Caetano Veloso e Gilbert Gil “Pense no Haiti, Reze pelo Haiti, O Haiti é aqui e O Haiti não é aqui”. No seu contexto histórico, africanos escravizados, influenciados pela Revolução Francesa, rebelaram-se em 1791, liderados pelo ex-escravos Toussaint L’Ouverture, levando à abolição da escravidão, que ocorreu no ano de 1794, fazendo Toussaint ser nomeado governador vitalício em 1801 e promovendo a libertação da condição de colônia da França, transformando o Haiti na primeira colônia das Américas a se libertar.
Por sua vez, processo de independência das colônias da América Espanhola foi realizado por uma oligarquia de Criollos, filhos de espanhóis nascidos na América, com exceção do pároco Miguel Hidalgo que no México defendia a devolução das terras às populações indígenas e Tupac Amaru. No passado, o Haiti marcado por uma história de resistência e luta, ia se transformando na primeira república negra das Américas.
No período da Guerra Fria, a América do sul vivia o contexto ditatorial do plano condor, orquestrado pelo serviço secreto da C.I.A (Estadunidense) nos anos François o Papa Doc, que exterminava a oposição e perseguia a Igreja, promovendo o terror com os tontons macoutes(milícia). Com sua morte, assume o seu filho Jean-Claude o Baby Doc., mantendo o regime ditatorial.
Jean Aristide participou ativamente dos movimentos que derrubaram Duvalier do poder, em 1986. Estimulou o surgimento de associações de bairro, principalmente em Porto Príncipe. Em 1988, foi expulso de sua ordem religiosa, cujos membros o consideravam radical.
Com o apoio (EUA) e do Partido Democrata, garantiu seu retorno à presidência do Haiti, em 1994. Permaneceu dois anos no cargo, período em que implementou políticas de cunho neoliberal. Ex-militares iniciaram um golpe contra Aristide, que solicitou ajuda internacional. O governo dos Estados Unidos, com o aval da ONU, decidiu intervir e, em 2004, sequestrou o presidente e o enviou para a República Centro-Africana Depois de sete anos de exílio, o ex-presidente voltou ao Haiti em 2011. Maurice Lemoine na revista Le Monde Diplomatique Brasil de 1 de setembro de 2004 afirma: “Aristide é seduzido pelo estabilishment norte-americano com quem colabora por ocasião da privatização das estatais. Inebriado pelo poder e pelo dinheiro, é destituído por um bando de mercenários. França e EUA, dão o golpe de misericórdia ao impor um primeiro-ministro e manter o país ocupado por tropas estrangeiras, retomando à violência dos tempos duvalieristas”.

Não entendemos a sanha covarde do imperialismo ao Haiti no passado que apoiava o regime ditatorial de” Papa Doc. e o Baby Doc., num país que passa por uma situação de caos político e econômico e é a nação mais pobre das Américas.
Em 1990, depois de realizado um novo golpe por meio do General Raoul, as Organizações das Nações Unidas (ONU) impõem sanções e os EUA ocupam o país, tendo exército do Haiti sido dissolvido, em mais uma ingerência das tropas estadunidenses, agredindo a soberania da nação haitiana, e em uma pratica comum de sua política externa.

O Brasil participou da missão de estabilização da ONU no Haiti, militarmente organizada pelo Exército do Brasil em 2004 (A MINUSTAH), o que foi elogiado por uns e criticado por outros setores da sociedade na época, mas na verdade não estabilizou nada.
Além de catástrofes naturais, como o terremoto que devastou 70% das construções da capital Porto Príncipe, provocando destruição e a morte de 250 mil pessoas em Janeiro de 2010, o Haiti. é marcado por sucessivos golpes de estados e violência política ao longo de história: teve 14 presidentes, mas apenas 3 deles completaram o mandato de cinco anos, e o mais recente acontecimento foi o assassinato do presidente Jovenel Moisés, morto em um ataque a tiros em sua casa, na capital Porto Príncipe.
Disputas entre as gangues e sequestros marcam o cotidiano do país, sendo inúmeras as milícias que disputam o poder, 77 quadrilhas armadas no total, segundo dados da Comissão Nacional de Desarmamento, Desmantelamento e Reintegração (CNRDDR).
O retumbante fracasso do governo de fato de Jovenel Moïse e do seu partido PHTK é bastante claro: a circulação, nessa pequena nação, de mais de 500 mil armas, das quais apenas 45 mil estão legalizadas, e como exemplo das milícias temos o Grupo dos 9. . O grande organizador do G9 e seu líder, o policial exonerado Jimmy Cherizier, conhecido como Barbecue, promoveu o terror pelas ruas, em uma operação realizada em 13 de novembro de 2017 em Grand Ravine, na qual oito civis e dois policiais perderam a vida e cerca de 30 pessoas ficaram feridas.
Foram registrados sequestros de profissionais a camponeses, de vendedoras ambulantes a policiais. As somas exorbitantes exigidas das famílias — a maioria de origem humilde — podem chegar a até US$ 100 mil. Já no ano passado os relatórios do Escritório Integrado das Nações Unidas no Haiti (Binuh) apontaram um aumento de 200% na incidência desse crime. “O Haiti é aqui, pense no Haiti”, quando da violência praticada também nas periferias das cidades brasileiras, nas comunidades mais carentes da ausência do Estado em relação a saúde e educação, na qual a única “assistência” é à repressão da polícia e a violência das milícias. o Haiti é aqui sim!

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