Natércia Lopes – Professora da Uneal e da Semed Maceió
O Brasil está entre os dez países mais desiguais do mundo e Alagoas reflete essa triste realidade. Estatísticas nos mostram que praticamente metade da população alagoana vive em situação de pobreza ou extrema pobreza, ou seja, com renda mensal que não chega a R$ 500. Os recordes em desigualdades obrigam as famílias, dentre as quais cerca de 92% são lideradas por mulheres, a recorrerem aos programas sociais.
Diante deste cenário desolador, a escassez de recursos torna os corpos que menstruam mais vulneráveis, assim um questionamento se faz necessário: como ter acesso a produtos e condições de higiene adequadas durante a menstruação?
A Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu em 2014 que o direito a higiene menstrual é um problema de saúde pública e de direitos humanos, em 28 de maio deste ano, a Organização Mundial de Saúde (OMS) criou o Dia Internacional da Dignidade Menstrual, que busca combater a situação de precariedade dos corpos que menstruam.
Segundo o relatório da ONU, uma em cada quatro meninas em período de escolarização não têm condições financeiras para comprar produtos seguros para usar durante a menstruação. Cabe ressaltar que o Brasil é o País que mais tributa absorventes e tampões no mundo, o que inviabiliza a compra destes produtos por quem se encontra em desfavorecimento socioeconômico.
A menstruação para meninas e mulheres que vivem na pobreza cerceia oportunidades de ascensão social através dos estudos. Ainda segundo o relatório da ONU, uma em cada dez meninas deixam de ir à escola para evitar o constrangimento de improvisar com fraldas, pedaços de tecidos, papelão, jornal, a contenção do fluxo menstrual.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) conceitua esse contexto como pobreza menstrual e engloba não só a falta de recursos financeiros para compra de absorventes, mas também a falta de saneamento básico, de água, de informação sobre o tema e de como ele ainda é visto pela sociedade como fatores que potencializam o problema. De acordo com esta instituição, 62% das mulheres que menstruam afirmaram que já deixaram de ir à escola ou a algum outro lugar de que gostam por causa da menstruação, e 73% sentiram constrangimento nesses ambientes. Essa associação da menstruação com a sujeira e a vergonha faz parte de uma construção social patriarcal que constitui uma violência de gênero naturalizada que precisa ser discutida.
A ausência destas alunas na escola prejudica seu desempenho escolar, e aumenta a desigualdade de gênero no mercado de trabalho, rompendo com a possibilidade destas estudantes de obterem autonomia financeira. A qualidade de vida também é afetada, uma vez que essas meninas e mulheres durante a menstruação deixam de fazer esporte na escola ou na universidade por medo do estigma da “sujeira menstrual”.
A falta de acesso a itens básicos de higiene no período menstrual faz com que meninas e mulheres acabem por desistir de seu sonho de estudar. A evasão escolar no período da menarca é algo que deve ser combatido com políticas públicas que garantam a dignidade menstrual. A infrequência escolar durante a menarquia não pode ser visto como algo naturalizado.
É necessária a construção da ideia de dignidade menstrual como direito, e da promoção de políticas públicas que facilitem o acesso a condições higiênicas adequadas para que estas meninas e mulheres possam vivenciar a menstruação enquanto um processo natural, sem ser um impeditivo para seu crescimento social e intelectual.
Dignidade menstrual, para que suas mãos, para que nossas mãos, não estejam sujas de sangue!