Castillo aguarda contabilização de 0,7% dos votos e promete realizar uma reforma constitucional no país
Após cinco dias de apuração, o candidato Pedro Castillo (Peru Livre) tem uma vantagem de cerca de 60 mil votos em relação à Keiko Fujimori (Força Popular), com 100% das atas processadas e 99,776% das contabilizadas, o que aponta uma tendência irreversível para a vitória da esquerda na disputa presidencial.
Desde que começou a se confirmar sua derrota, Keiko Fujimori passou a denunciar uma suposta fraude, sem apresentar provas, e pediu a revisão de 500 mil votos. O voto no Peru é impresso o que explica a demora para os resultados oficiais, no entanto a apuração estava prevista para finalizar na última quarta-feira.
Em redes sociais, grupos de extrema-direita passaram a difundir mensagens pedindo uma intervenção militar para impedir a “ameaça comunista” , representada pelo postulante do partido Peru Livre.
Nas ruas, movimentos camponeses e organizações sociais convocam o povo peruano a defender o resultado final.
Este processo eleitoral representaria o fim de uma crise política que envolveu os últimos quatro presidentes do país em denúncias de corrupção. Desde o fim do regime de Alberto Fujimori (1990-2000), pai de Keiko, o Peru não elege um representante vindo das camadas populares, o que pode explicar o temor da direita.
Pedro Castillo estava entre os últimos colocados nas pesquisas de opinião durante o primeiro turno e acabou surpreendendo como primeiro colocado, com 2,7 milhões de votos. “A mudança e a luta apenas começam”, afirmou depois dos resultados do dia 11 de abril, e tinha razão.
O “profe”, como ficou conhecido durante a campanha eleitoral, tem 51 anos e é natural de Cajamarca, zona rural peruana. De origem humilde, é o terceiro de nove irmãos, que tinham que caminhar cerca de duas horas para frequentar a Escola Rural de Anguía, província de Chota.
Mais tarde, estudou no Instituto Superior Pedagógico Octavio Matta Contreras e na Universidade César Vallejo, onde obteve mestrado em psicologia educativa.
É professor da educação básica e se destacou durante a greve nacional da educação de 2017, quando os docentes reivindicavam melhores salários e a reforma do plano de carreira.
Durante a paralisação que durou 50 dias, Castillo liderou uma facção dissidente do tradicional Sindicato Único de Trabalhadores da Educação do Peru (Sutep) e foi acusado pela direita de ter ligações com o Movimento pela Anistia e Direitos Fundamentais (Movadef), o braço político do grupo armado Sendero Luminoso, algo que ele sempre negou.
Mesmo com forte propaganda contrária, o “profe” teve vitória expressiva nas zonas rurais e nas periferias do país, obtendo cerca de 70% dos votos. Castillo perdeu em 8 dos 25 estados do país: Ica (52% Keiko e 47% Castillo), La Libertad (59% / 40%), Lambayeque (58% / 41%), Lima (64% / 35%), Loreto (52% / 47%), Piuera (60% / 39%), Tumbes (65% / 34%) e Ucayali (51% / 48%).
Além do passado grevista, durante sua vida política, disputou a prefeitura de Anguía, em 2005, e transitou por dois partidos até chegar à secretaria geral da sua atual legenda.
“Não mais pobres num país rico”
Com clara orientação marxista, Castillo tem como bandeira principal a defesa de uma reforma constitucional, que motivou protestos massivos em novembro de 2020 no país. A atual carta magna foi promulgada em 1993, durante o regime de Alberto Fujimori (1990-2000), pai da sua rival na disputa no segundo turno.
Além disso, o novo presidente peruano defende uma lei de regulação da mídia e aumento do orçamento da educação de 3,5% para 10% do Produto Interno Bruto (PIB), este último para investir em infraestrutura, melhores salários aos professores e em um programa que convocaria 50 mil profissionais para erradicar o analfabetismo no país.
Também defende uma reforma judicial, com a eleição popular dos magistrados que compõem o Tribunal Constitucional peruano.
Sua equipe de governo com 15 nomes foi apresentada no dia 18 de maio, com vários profissionais de currículo técnico. Entre eles, o ex-procurador anticorrupção Avelino Guillén, conhecido por promover um processo contra Alberto Fujimori, o físico nuclear Modesto Montoya e a socióloga Anahí Durand.
“Não estamos designando ministros”, advertiu Castillo, ao comentar que não iria repetir a velha prática de dividir cargos de acordo com as alianças eleitorais. Em maio, divulgou uma prévia do seu plano de governo, mas promete apresentá-lo nos primeiros 100 dias de gestão.
Polêmicas dentro da esquerda
Castillo não foi consenso entre as organizações de esquerda no primeiro turno por ser um nome pouco conhecido nacionalmente e por suas posições conservadoras em relação à agenda de gênero.
::O que defendem Pedro Castillo e seu partido::
Em mais de uma ocasião, se manifestou contra pautas como casamento igualitário entre pessoas do mesmo sexo. Sobre a legalização do aborto no Peru, que atualmente é permitido somente em casos de risco à vida da gestante ou do feto, disse que, embora não concorde com uma ampliação das possibilidades legais, encaminharia o assunto para uma eventual Assembleia Constituinte decidir.
Michele de Mello
Fonte: Brasil de Fato