Agro, falta de verbas, de política e a bagunça institucional, não são causas naturais

Queimadas em proporções sem precedentes tomam vastas regiões no sudeste, Pantanal e Amazônia. Já é o pior ano desde 1998, início da série histórica do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). É verdade que este ano as condições climáticas para incêndios surpreenderam os cientistas. Na América do Sul, há focos simultâneos em outros países. Mas há outras verdades.

Desde 2019 (governo Bolsonaro) houve uma intensificação do desmatamento em todos os ecossistemas. Segundo os cientistas, há uma forte correlação dele com a perda de chuva, o aumento de temperatura e de emissões de CO2. O que já vinham alertando o governo, mas não houve qualquer preparação. Servidores do Ibama e ICMBio ficaram quase um ano em greve, entre 2023 e 2024, para obterem um acordo. Caíram 70% os autos de infração na Amazônia; no Amazonas havia apenas um helicóptero e um avião capacitados. No orçamento de 2024, o Meio Ambiente tem 3,6 bilhões, 16% a menos do que em 2023, para o combate a incêndios são 219 milhões, contra 236 milhões em 2023.

A mão do agronegócio

Os latifundiários estão ligados historicamente ao desmatamento, de forma predatória e criminosa. Este ano a ofensiva do agronegócio sobre a terra, via queimadas, está sendo maior, para avançar  nas áreas protegidas e reservas indígenas.

Esse setor que embora sempre tenha tido grande peso na economia nacional, subordinada aos países industriais, tem sua participação no PIB cada vez maior nos últimos anos, em detrimento da indústria nacional. É o modelo de exportação de matérias primas voltando a ganhar terreno.

É sobre essa estrutura econômica e produtiva que se assenta o poder político no país. Esses senhores estão encravados nas intuições brasileiras, no Congresso com  grande bancada, no judiciário e até nos ministérios do Executivo.

Bagunça institucional

Na falta inicial de ações práticas do governo, FlávioDino do STF ordenou medidas autorizando o governo a um “crédito extraordinário” fora do arcabouço fiscal. E convocou uma “conciliação” dos poderes, como já havia ocorrido no caso do Marco Temporal. Dino ainda se reuniu com de governadores, que têm suas responsabilidades: é sua atribuição a segurança pública primária, parte da fiscalização e a aplicação de multas e outras medidas de amparo. Há, de fato, uma “bagunça institucional”, para dizer o mínimo. O STF além de legislar várias vezes, o que não é sua função, agora tomou medidas de governo.

Na sequência Lula anunciou modestos 514 milhões – 1,2% do anunciado para as enchentes no RS – para a Defesa Civil e os bombeiros, e flexibilizou o acesso ao Fundo Amazônia (BNDES). Um aporte de verbas compatível se choca com a política de déficit zero do arcabouço fiscal, em primeiro lugar, mas também com a farra das emendas parlamentares. Desde 2019, apenas 0,09% dos 194 bilhões garfados foram para incêndios.  

A ministra Marina Silva propôs uma “Autoridade Climática” e a disposição de verbas fora do arcabouço. Mas Arthur Lira só aceita se impuser o seu nome e rejeitou maior penalização de crimes ambientais, proposta pelo STF. Sua “base” passa pelos 290 deputados do Agro.

Que medidas são necessárias?

Sem esgotar a questão, um bom começo é investigar e punir os responsáveis e tomar medidas práticas, nos níveis federal, estadual e municipal. Urge constituir frentes de trabalho imediatas contra a destruição das queimadas com contratações emergenciais e concursos públicos nos três níveis. Excluir do arcabouço fiscal os investimentos na área e confiscar a terra de quem queima, desmata e faz grilagem. Mas, medidas de médio prazo sobre a questão da terra são incontornáveis, como a demarcação das terras indígenas e a titulação dos quilombos, além da reforma agrária.

Tiago Maciel

Fonte: O Trabalho

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