Longa recebeu o prêmio de melhor equipe em mostra do tradicional festival francês. Antes do evento, produção protestou contra o marco temporal: “O futuro das terras indígenas no Brasil está sob ameaça”
O filme A Flor do Buriti foi premiado na noite de ontem (26) no Festival de Cinema de Cannes, na França. Dirigido pelo português João Salaviza e pela brasileira Renée Nader Messora, o longa ganhou o prêmio de melhor equipe na mostra “Um Certo Olhar”.
A obra repete o sucesso dos diretores que, em 2018, na mesma mostra, venceram o Prêmio Especial do Júri, com A Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos. Ambas as produções foram realizadas em aldeias do povo indígena Krahô, em Tocantins. A Flor do Buriti, contudo, faz um retrato dos últimos 80 anos, dos mais de 200 de contato dos Krahô com os cupe – os não indígenas.
O filme foi rodado ao longo de 15 meses, em quatro aldeias. Por meio dos depoimentos dos indígenas, eles reconstituem as últimas oito décadas. Do massacre sofrido pelo povo, em 1940, às consequências do bolsonarismo na vidas dos Krahô e dos povos indígenas em geral, que levaram aos protestos em abril de 2022, em Brasília. Explorando as fronteiras entre documentário e encenação, o longa conta também com a participação da líder Sônia Guajajara, desde janeiro ministra dos Povos Indígenas.
Protesto contra o marco temporal
Antes da estreia em Cannes, a diretora da obra destacou a importância de ocupar novamente a mostra com a voz dos povos indígenas brasileiros. “É a segunda vez que a gente viaja para a França com os Krahô. A segunda vez que eles (os participantes do evento) vão escutar um filme apresentado num idioma indígena (a língua timbira, da família Jê). É a segunda vez que eles vão escutar da boca dos Krahô qual a situação do cerrado brasileiro, o bioma mais devastado do país e um dos mais importantes também porque é o berço das bacias hidrográficas mais importantes do Brasil”, destacou, em entrevista ao site DW Brasil.
Durante a entrevista, Renée também confessou sua expectativa de que a repercussão internacional sobre a obra tenha impacto no julgamento do chamado Marco Temporal, que deve ser retomado no dia 7 de junho pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Nesta semana, após manobra do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a tese jurídica apoiada por ruralistas e criticada pelos povos indígenas ganhou regime de urgência no Legislativo e pode ser votada na próxima terça (30).
- Se aprovado, o marco temporal estabelecerá que a data de promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988, deve ser adotada para a definição da ocupação tradicional da terra por indígenas. O que pode levar muitos povos indígenas a perder o direito à sua terra tradicional. Já que muitos grupos foram retirados de seus territórios sem o reocupar até a data da Constituição. Ainda na quarta (24), a equipe do filme A Flor do Buriti protestou no tapete vermelho da competição. “O futuro das terras indígenas no Brasil está sob ameaça, não ao marco temporal”, dizia a faixa estendida pela equipe do longa.
- Disputa segue
Após a premiação, o cineasta brasileiro Karim Ainouz celebrou em suas redes a conquista da obra. “Mil vivas ao cinema nacional. Parabéns a toda equipe!”, escreveu em seus stories no Instagram.
Karim também participa do Festival de Cannes e é um dos concorrentes pelo prêmio principal da mostra, a Palma de Ouro, que será entregue neste sábado (27). Ele disputa como diretor do longa Firebrand, sua primeira obra em língua inglesa. Em 2019, Karim foi premiado, também em Cannes, na sessão “Um Certo Olhar”, pelo filme A Vida Invisível.
A brasileira Carol Duarte também disputa uma estatueta no festival, pelo protagonismo no longa italiano La Chimera.
Fonte: Rede Brasil Atual