Diogo Xavier

A lógica neoliberal, vendida desde os anos 90, é de que tudo que é privado é bom, enquanto tudo que é público é ruim. Empresas são modernas e eficientes, já o serviço público é lento e precisa ser vendido urgentemente.

Obviamente essa mesma ideia iria chegar ao futebol, na verdade já está presente na transformação do “negócio futebol” em entretenimento, mas, de 2021 para cá, isso foi muito intensificado com a Lei das Sociedades Anônimas do Futebol (Lei 14.193/2021), que dá muitos benefícios para que os clubes deixem de ser uma Sociedade Associativa e tornem-se Empresas.

Esse discurso está atrelado também a ideia central de que tudo existe para dar lucro. Não existe espaço na sociedade capitalista pro lúdico se não for voltado para geração de valor. Um time de futebol gera paixão e essa paixão deve ser monetizada por alguém que torne ele lucrativo. No mundo capitalista até o descanso deve servir ao lucro, quanto mais um clube de futebol.

O moderno versus o ultrapassado

Na discussão sobre esse tema, em qualquer programa esportivo, é muito comum ouvir argumentos como “Ou vira SAF ou vai falir”, “Essa é a oportunidade e quem não embarcar vai ficar no passado”. Dentre outras variações desse discurso que passa uma mensagem nítida: A SAF é a única solução para o seu clube. Passando uma ideia de que não temos alternativas a não ser aceitar esse modelo.

Essa forma de debate cerceia completamente o contraponto, pois quem contesta o modelo empresarial é tido como defensor de más gestões e não quer o desenvolvimento do futebol. Fazendo com que não seja possível um debate franco sobre o que pode dar certo e o que pode dar errado em colocar instituições centenárias, que movem milhões de apaixonados, nas mãos de pessoas que não tem ligação nenhuma com esses clubes.

Essa baixa participação popular é um grande problema, pois a torcida é quem sustenta esses times e ela deveria estar presente em todas as decisões importantes, no entanto isso não acontece

A forma como se estruturou a gestão dos clubes precisa de uma mudança enorme. Em sua grande maioria são pequenas oligarquias que mantém o controle sobre a instituição por décadas e onde a estrutura eleitoral permite pouquíssimas mudanças. Clubes gigantescos como Corinthians e Flamengo têm eleições com um quórum baixíssimo, 2183 eleitores no Parque São Jorge e 2000 eleitores na Gávea.

Essa baixa participação popular é um grande problema, pois a torcida é quem sustenta esses times e ela deveria estar presente em todas as decisões importantes, no entanto isso não acontece. Os próprios conselhos deliberativos são espaços super fechados onde em muitos casos é exigido o pagamento de uma quantia alta por mês para participação no espaço de deliberação.

Essa falta de participação da torcida não será solucionada pela SAF, muito pelo contrário, pois agora a associação vira um ente privado. Torcedor é consumidor e não opina nas decisões do Clube. Isso já gerou uma grande revolta na torcida do Cruzeiro após o goleiro Fábio, ídolo do time com quase 1000 jogos pela Raposa ter sido demitido logo que a SAF se estruturou.

Ouvir mesas redondas sobre esse tema nos últimos meses é sempre um debate sobre quando e como os clubes irão virar uma empresa e nunca um debate profundo se esse é o melhor caminho. E assim o fatalismo se abateu sobre mais uma discussão que mudará de vez o futebol brasileiro.

Não faltam exemplos no Brasil e no mundo de Clubes empresa que faliram e até deixaram de existir, mas esses quase não aparecem na mídia. Enquanto isso o trator do clube empresa vem passando.

Fonte: Esquerda Online

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