PAULO MEMÓRIA – jornalista e cineasta
A China caminha a passos largos para se tornar a maior potência econômica mundial bem antes de chegarmos a metade deste já atribulado século XXI. Minha avó, uma sueca que veio morar no Brasil na década de 30, costumava dizer que um dia a raça amarela iria dominar o mundo. Tomem como amarelos os orientais, que aos olhos da minha oma (avó em alemão – meu avô era germânico) era como enxergavam os asiáticos do extremo-oriente: mongóis, coreanos, japoneses e chineses. Ao longo das últimas décadas do século XX e estas primeiras décadas do século que vivemos, efetivamente, de acordo com as obsoletas e superadas definições biológicas das etnias que existiam anteriormente ao surgimento do Projeto Genoma (trabalho de um conjunto de países para desvendar o código genético das raças pelo DNA), nos idos dos anos 90, a “raça amarela” tem ocupado os espaços das antigas nações colonialistas e imperialistas, sobretudo àquelas que ascenderam geopolítica e economicamente nos escombros das duas grandes guerras mundiais do século passado, desmontando, simultaneamente, o pacto de Varsóvia e a OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte, que viabilizou a Guerra Fria, protagonista da disputa político-ideológica mundial até a queda do Muro de Berlim e a desintegração da antiga URSS.
Foi assim que vimos o crescimento econômico e tecnológico do Japão nos anos 70 e 80, a ascensão dos “tigres asiáticos”, nomeadamente a Coreia do Sul e Taiwan, na década de 90 e agora a consolidação da China como a grande superpotência global, dominando o mundo não pela força das intervenções militares e sim pela soberania econômica dos mercados produtivos e financeiros, bem como do comércio internacional como um todo. A China está comprando literalmente a África e muitos países subdesenvolvidos, se tornando o principal parceiro comercial de praticamente todos os países emergentes do mundo e comprando a dívida interna do seu principal adversário nesta queda de braço da conquista planetária, o outrora todo poderoso e unilateralista EUA. Um documentário bastante didático que mostra este fenômeno, é o ganhador da estatueta do Oscar neste género em 2020, “Indústria Americana” (American Factory), do casal de cineastas norte-americano Júlia Reichert e Steven Bognar, com produção do casal Barack e Michele Obama, que conta a história da incorporação de uma falida fábrica da emblemática GM – General Motors, um símbolo do capitalismo defendido pelo Tio Sam, ocorrida há 10 anos em Ohio, pela multinacional fábrica de vidros automotivos chinesa Fuyao, com as rigorosas metodologias de produção da China, em conflito com o leniente e ultrapassado capitalismo fordista posto em prática nos Estados Unidos, evidenciando, em pleno solo ianque, o conflito sino-americano.
O vertiginoso crescimento chinês só é possível graças as reformas levadas a cabo por Deng Xiaoping, que liderou a China de 1978 até 1992, quando introduziu naquele imenso país asiático, com a inacreditável população de 1,393 bilhão de pessoas, o que denominou como a “segunda revolução”, ou seja, a profunda reforma econômica que originou a chamada “economia de mercado socialista”, atualmente conceituado de “socialismo de mercado”, que possibilitou ao povo chinês o verdadeiro “grande salto para frente” e para a construção de um país moderno economicamente e conservador das suas milenares tradições culturais e concepções ideológicas. O atual presidente Chinês Xi Jinping é um aplicado discípulo deste caminho de transformações dos conceitos estabelecidos pela revolução chinesa de 1949, liderada pelo “Grande Timoneiro” Mao Tsé-tung, como o próprio se autointitulava, e que, certamente, fará do velho “Império do Meio”, o grande vetor para o avanço do “socialismo com características chinesa”, daquilo que parece ser o surgimento de uma nova era. Ao que parece, a minha velha avó tinha mesmo razão na sua premonição e prognóstico sobre o futuro da humanidade.