Resistência às medidas aponta para “paro general” em janeiro

Apenas dez dias após a sua posse como presidente da República em 10 de dezembro, Javier Milei encontrou a resistência de manifestantes em Buenos Aires aos seus planos anunciados na campanha eleitoral.

Em 20 de dezembro, data que marca a fuga do ex-presidente Fernando de la Rúa em helicóptero da Casa Rosada, sede do governo argentino, diante de um levante social em 2001, partidos e grupos de esquerda fizeram uma primeira marcha contra “o plano de ajuste e miséria de Milei e FMI” com cerca de 10 mil pessoas à tarde.

Mas o mais significativo é que, à noite do mesmo dia, após a fala do novo presidente em rede nacional, centenas de milhares de argentinos, de forma espontânea, saíram às ruas da capital, concentrando-se na Praça do Congresso, e também em outras cidades. Manifestações que continuaram no dia seguinte ao anúncio do Decreto Nacional de Urgência (DNU), o qual modifica mais de 300 leis e normas existentes.

Nas palavras do sindicalista Hugo Godoy, da CTA Autônoma, o DNU “é uma bomba de nêutron que quer arrasar a Argentina, as instituições da república e todos os direitos que durante anos fomos capazes de construir”. Já Hugo Yasky, da CTA dos Trabalhadores, afirmou que “nem na época da ditadura se tentou chegar tão longe”.

De fato, esse megadecreto, que terá que ser avalizado pelo Congresso, mas já entra em vigor em 29 de dezembro, declara uma guerra contra os direitos sociais e trabalhistas, desregula o comércio interno e externo, anula a lei de aluguéis e aponta para a privatização de todas as empresas públicas. Em suma, tudo aquilo que o capital financeiro gostaria que os governos aplicassem em todo o mundo.

Milei prossegue na ofensiva

Após o DNU, Javier Milei anunciou a não renovação dos contratos de cerca de 7 mil empregados dos serviços públicos e estatais que vencem em 2023, provocando a reação da Associação dos Trabalhadores do Estado (ATE), um dos mais fortes sindicatos argentinos, que se declara em estado de mobilização permanente.

Em 27 de dezembro, a CGT, as duas CTAs e movimentos sociais fizeram o terceiro ato de protesto contra o megadecreto de Milei em frente ao Palácio da Justiça em Buenos Aires, exigindo que se declare como inconstitucionais medidas como a da flexibilização do vínculo trabalhista. Paralelamente prefeitos e concelhos municipais também denunciam os decretos inconstitucionais e exigem do Congresso que derrube o DNU.

Mas Milei, que conta com a bênção do FMI, se apoia também na desilusão e raiva de setores populares contra o peronismo e o governo anterior para seguir na ofensiva, agora com a chamada “lei ônibus”, projeto que reforça o caráter pessoal do poder ao pedir ao Congresso a transferência dos poderes legislativos ao executivo até 2025, o que inclui os códigos civil e penal, além de alterar toda a organização econômica da Argentina com as privatizações, inclusive do Banco da Nação.

Paro General” em 24 de janeiro

O enfrentamento que se anuncia será duro. Apenas 18 dias após a posse de Milei, uma plenária nacional da CGT, a maior central sindical do país, convocou um “Paro General”, ou seja, uma paralisação nacional, a partir do meio dia de 24 de janeiro, contra o DNU e a “lei ônibus”, um “paro” de 12 horas ao qual se somaram as duas CTAs.

A situação na Argentina que, do ponto de vista da vida cotidiana do povo, já sofre o impacto das medidas do novo governo com o aumento dos aluguéis, perda do poder de compra dos salários e pensões, desorganização das relações de trabalho e descontrole de preços, tende a se tornar cada vez mais explosiva, enquanto o próprio governo afirma que “vai piorar antes que melhore”. É o que devemos seguir acompanhando atentamente nesta virada de ano.

29 de dezembro de 2023

Julio Turra

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