Publicamos abaixo o artigo de Eudes Baima, doutor em educação e professor da Universidade Estadual do Ceará.

Sobre o dito ensino domiciliar

O chamado ensino domiciliar teve texto-base aprovado ontem na Câmara dos Deputados.

Por óbvio nenhum pai ou mãe esteve jamais proibido de ensinar seus filhos e filhas em casa. 

Do que se trata agora é de equiparação da instrução escolar às lições caseiras. Tal equiparação, que pode se tornar legal, é também obviamente impossível. 

As razões são várias, mas nos detenhamos a uma questão preliminar. A educação escolar configura uma síntese, construída historicamente pela humanidade, dos elementos principais de compreensão do mundo, recolhidos do patrimônio intelectual comum da espécie. Com todas as manchas, insuficiências e escolhas erradas, os currículos escolares, não por acaso, em geral semelhantes em cada país, idealmente dão acesso  às principais ferramentas de entendimento da realidade às gerações escolares. O que se ensina em comum, portanto, não é uma arbitrariedade manipulada ao bel prazer de professores e instituições, mas constitui uma média dos fatores necessários à perpetuação da espécie humana sobre a terra no que diz respeito ao rol de conhecimentos necessários para assegura-la. 

Claro que, como todos os fenômenos humanos, o currículo escolar não é ponto pacífico e é objeto constante disputa social, pedagógica e política na arena pública. 

A ideia-base do ensino domiciliar, a saber, a de que ele transferirá às famílias o arbítrio sobre o que ensinar aos seus filhos, é plenamente nula e irracional (no popular, uma ideia de jerico) pois atribui aos pais uma decisão que seria tomada ao largo da vida social, do processo histórico, da etapa de desenvolvimento da ciência e das sínteses pedagógicas a que se chegou na história.  

A ideia-base portanto é falsa pois desloca o processo ensino-aprendizagem da vida, do desenvolvimento social e do currículo produzido pelo milenar processo de tentativa e erro que consagrou os conteúdos escolares.

A partir daí, se pode listar longamente o absurdo da lei que pode ser aprovada. Mas isso é assunto para outro artigo.

Fonte: Portal Invest NE

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