Não há demérito qualquer em ser reconhecido como antifascista, motivo, aliás, de orgulho para muitos que assim são lembrados. Todavia, ser assim classificado em uma lista divulgada entre grupos de ideologia diversa e, por vezes, radical e violenta, nos tempos atuais, caracteriza difícil exposição e gera dever de indenizar.

Com esse entendimento, o juiz Márcio Teixeira Laranjo, da 21ª Vara Cível de São Paulo, condenou o deputado estadual Douglas Garcia (PTB) a indenizar todas as pessoas incluídas em um “dossiê antifascista” produzido e divulgado nas redes sociais por iniciativa do parlamentar.

Conforme a sentença, Garcia terá que indenizar pelos danos materiais e morais causados a todo e qualquer terceiro que teve seu nome arrolado no dossiê e se viu, por razão de tal fato, lesado. A apuração dos danos se dará por meio de feitos individuais liquidatórios.

A decisão se deu em ação civil pública em que o Ministério Público contestou a inclusão no dossiê de dados e informações privadas de aproximadamente mil pessoas. O deputado, por sua vez, afirmou não haver violação à honra dos envolvidos, uma vez que os dados seriam públicos.

No entanto, para o juiz, é “inegável” que Garcia contribuiu com a colheita e divulgação de dados de terceiros, “pois literalmente requereu, de seus seguidores, a remessa de dados de ‘antifascistas’ e o compartilhamento da publicação correlata, buscando nada menos que a máxima publicidade da campanha intentada”.

Para o magistrado, não convence o argumento do parlamentar de que os dados expostos são públicos e, por isso, não merecem proteção. Isso porque o dossiê contém, muitas vezes, endereços e telefones de terceiros, informações que, segundo Laranjo, são sensíveis e protegidas pelo direito fundamental à privacidade.

“Mesmo a exposição de dados públicos assume proporção lacerante a seus titulares, quando se dá justamente perante grupos de convicção contrária, em época tal qual a presente, sulcada por grande polarização política e radicalismo. Ainda, o fato de que a divulgação de dados privados, pelo seu titular, em rede social ou afim, não implica em tácita autorização para seu uso, por terceiros quaisquer, quão mais com o fito persecutório aqui desenhado”, completou.

Laranjo também criticou o envio do dossiê à polícia, “como se criminosos fossem todos aqueles lá enumerados”, simplesmente por terem ideologia diferente a de Garcia e seus apoiadores, “uma conduta sectária e manifestamente autoritária, que não aceita divergências típicas de uma democracia”.

“Evidente, pois, a repercussão deletéria, a mácula subjetiva, impingida àqueles cujos dados foram arrolados no dossiê e postumamente divulgados, consubstanciada pela manifesta violação a seu direito de privacidade, honra e mesmo a suas liberdades políticas e de opinião, sendo inescapável o correlato dever de indenizar”, concluiu o juiz ao decidir pela condenação de Garcia.

Por fim, o magistrado também afirmou que a imunidade parlamentar não isenta Garcia de indenizar pelos danos causados aos incluídos no dossiê, uma vez que o documento não tem relação alguma com as atividades de um deputado estadual. 

Dano coletivo e retratação
O juiz negou pedido do MP de indenização por dano moral coletivo, no valor de R$ 200 mil. Laranjo citou entendimento do STF de que não há lesão imaterial coletiva quando se trata de violação a direitos individuais homogêneos, como é o caso dos autos.

Ele também negou pedido para que o deputado se retratasse publicamente ou apagasse as postagens em que incitou seus seguidores a coletar dados de “antifascistas”, por se tratar de textos genéricos e que não se referem diretamente a nenhum dos incluídos no documento.

“As publicações que deram azo à controvérsia, ainda que permeadas por teor eventualmente contundente, sobremaneira ideológico e mal sopesado, não despontam, por si, como suficientemente lacerantes, vez que não vinculadas, no específico, a qualquer dos terceiros arrolados no dossiê. Inexistindo dano pela palavra, por certo descabido saneamento qualquer por igual via”, explicou.

Fonte: Conjur

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