Um decreto recente do governo reconheceu os cuidados com os filhos e a casa como parte do tempo de serviço
Em Pinamar, pequena cidade da costa bonaerense, vive Beatriz Somoza, que, aos 62 anos, até pouco tempo não conseguia desfrutar da sonhada aposentadoria à beira-mar. Ao contrário. O sumiço dos turistas no último ano e meio de pandemia e o fim do pagamento do Ingresso Familiar de Emergência, programa social que garantiu renda mínima aos trabalhadores autônomos durante a crise sanitária na Argentina, deixaram Somoza em apuros.
Felizmente, não por muito tempo. Um decreto recente do governo que reconheceu os cuidados com os filhos e a casa como parte do tempo de cálculo das pensões permitiu o acesso imediato de Somoza ao benefício – caso contrário, ela teria de esperar mais cinco anos. A iniciativa, calcula-se, beneficiará outras 155 mil mulheres argentinas até o fim do ano.
“Tudo que me pediram foram as certidões de nascimento dos meus quatro filhos e foi super-rápido”, conta Somoza. “Pude me aposentar pagando muito pouco de uma moratória, o que para mim é muito mais fácil.” Cada criança encurtou em um ano o tempo necessário para a aposentadoria. O decreto, explica Santiago Fraschina, secretário-geral da Administração de Segurança Social, visa reduzir a desigualdade entre homens e mulheres.
“Nosso diagnóstico saiu da tentativa de entender o que estava acontecendo para que essas mulheres chegassem aos 60 anos sem ter tempo de contribuição suficiente para se aposentar”, afirma. “A conclusão é de que, como acontece em toda parte, não só aqui na Argentina, a mulher sofre uma grande discriminação no mercado de trabalho.”
O decreto desconta um ano para cada filho natural, dois em caso de adoção e 12 meses a mais para aqueles com necessidades especiais. Além disso, beneficiárias da versão argentina do Bolsa Família, a Asignación Universal por Hijo, por ao menos um ano poderão computar outros dois adicionais de serviço para cada criança.
Segundo o Instituto Nacional de Estatística e Censos, 76% das tarefas domésticas são realizadas pelas mulheres. Quando o fazem, os homens dedicam menos horas a esse tipo de trabalho, 3,4 horas em média, contra 6,4 das companheiras. “Como as mulheres têm muito inconvenientes para se inserir no mercado de trabalho, depois para se manter nele e fazê-lo de maneira formal, apenas uma em cada dez, entre 55 e 65 anos, consegue pagar mais de 20 anos de contribuição”, descreve Mercedes D’Alessandro, secretária especial de Economia, Igualdade e Gênero.
O país junta-se ao Uruguai, que inclui o trabalho materno no cálculo da aposentadoria, e ao Chile, onde as mulheres recebem um abono por filho.
Fonte: Carta Capital