O mandato britânico está na origem da opressão colonial de Israel na Palestina e do atual genocídio em Gaza

Por ALBERTO HANDFAS*

O mandato britânico está na origem da opressão colonial de Israel na Palestina e do atual genocídio em Gaza. Novo filme palestino relembra o papel central do imperialismo no conflito

Há um século, a Palestina entrava em ebulição. Era empurrada a uma espiral de violência e injustiças coloniais a serviço de interesses imperialistas da qual, até o presente, ainda não pôde se livrar. Um turbilhão que teima em manter-se embrenhado ao centro da luta de classes internacional pelos últimos cem anos.

As fases iniciais dessa sucessão de eventos catastróficos são retratadas no filme “Palestina 36”, a décima obra cinematográfica da diretora palestina Annemarie Jacir[i]. Se não é a melhor, certamente é a politicamente mais impactante produção de cinema deste ano. Nela, a história, como em um poema épico, se desenrola impiedosa aos olhos de um povo resiliente submetido a uma súbita e implacável opressão.

O mundo, afinal, não começou em 7 de outubro de 2023 e nem tampouco é muito adequado comparar a violência do oprimido com a do opressor. A violência da “Al Aqsa Flood” fora precedida por décadas de violenta limpeza étnica israelense, cujo paroxismo é o atual genocídio em Gaza. Décadas que, por sua vez, foram precedidas pela Naksa (1967) e pela Nakba (1948) [ii]. As quais também foram antecedidas e forjadas pela contrarrevolução imposta pelo massacre militar operado pelo imperialismo britânico em 1936-39, infortúnio humano tão bem interpretado por Jacir e seu premiado elenco.

A administração colonial britânica na Palestina, com seu compromisso estratégico ao projeto de colonização sionista, vinha provocando desapropriações de terras aos fellahin (lavradores) e ameaças de destruição de direitos cidadãos aos palestinos em seu próprio país. A resistência popular a tais políticas gerou uma onda de mobilizações que eclodiram em 1936 e ficaram conhecidas como a “Revolta Árabe na Palestina”. Ainda que a luta popular tenha forçado, ao final, algumas concessões pelos britânicos, estes jogaram todo seu poderio militar colonial para massacrar exemplarmente o movimento. Impuseram uma derrota ao povo palestino que acabou por selar os rumos da Nakba dez anos depois e segue definindo sua tragédia até hoje.

A arte imita a vida, que imita a arte

O início das filmagens de “Palestina 36”, após dez anos de preparativos e planejamentos prévios, foi atropelado pelos acontecimentos de outubro de 2023. Isso levou não apenas a um vai-e-vem de sua locação e atrasos na sua produção, mas também a uma inquietante sensação de déjà-vu. Um infernal déjà-vu. “A história do filme é a origem do que ocorre hoje na Palestina e tudo o que ocorre no filme segue ocorrendo hoje”, explica Jacir.[iii].

A diretora compõe um complexo enredo de personagens históricos e fictícios. Conta assim a história de Yussef (Karim Daoud Anaya), um jovem camponês, que trabalha como motorista em Jerusalém enquanto segue vivendo em sua aldeia natal, onde também ajuda na agricultura comunal. Cresce ali a apreensão entre lavradores palestinos. Temem perder suas terras ao testemunhar a agressiva expansão da colonização sionista em assentamentos vizinhos, intensificada agora com a chegada de imigrantes foragidos da perseguição antissemita europeia.

Em meio às idas-e-vindas de Yussef entre o agito urbano e a vida aldeã no meio rural, o filme apresenta o desenrolar de suas relações com sua vizinha, a jovem viúva Rabab (Yafa Bakri) – com quem se enamora. E as relações dela com seus pais idosos e sua filha pré-adolescente, Afra (Wardi Eilabouni). Esta, por sua vez é amiga de Kareem (Ward Helou), filho do padre Boulos (Jalal Altawil) – líder cristão ortodoxo na aldeia. Em meio a tensões nas terras ao lado, ocupadas por um novo assentamento sionista (um Kibbutz) altamente armado e hostil, uma contemplativa Afra pergunta à sua mãe por que os vizinhos teriam vindo de tão longe para viver bem ali. Rabab explica que os judeus recém-instalados na fazenda ao lado imigraram por “não serem aceitos em seus países”.

A ela, assim como às massas palestinas, o problema não era a imigração de judeus em si, mas a explícita e declarada intenção por parte das organizações sionistas da criação de um Estado apenas a tais imigrantes. Um Estado que controlaria o país excluindo a imensa maioria de sua população nativa. 

Em Jerusalém, os patrões de Yussef, um casal de jornalistas burgueses palestinos e politicamente bem articulados, dedicam-se a debates a respeito das ameaças à existência da Palestina. O alto-comissário do Mandato Britânico, general Wauchope (Jeremy Irons), supervisiona a colonização imposta pela Inglaterra e entusiasticamente patrocina a expansão sionista. Já seu secretário, Thomas Hopkins (Billy Howle) simpatiza com os palestinos e, frustrado, indigna-se com a política que a administração para a qual trabalha lhes impõe. A arrogância de oficiais britânicos frente a população nativa revela a ideologia colonialista aprendida nas escolas militares e, mais adiante, herdada ao Estado de Israel. O qual lhes substituiu na implementação daquele tipo de opressão que exige a desumanização dos colonizados pelos colonizadores.

Tal continuidade histórica é comprovada numa ironia macabra ocorrida na própria produção do filme. Nele, durante a repressão britânica à Revolta na Aldeia, o jovem irmão de Yussef é amarrado pelos soldados ingleses à frente de um veículo, para lhes servir de escudo humano. A filmagem dessa cena ocorreu em Nablus, Cisjordânia, no mesmo dia em que, no mundo real e a poucos quilómetros dali, soldados israelenses amarravam um palestino ferido a um veículo militar durante um ataque em Jenin. “Tudo o que está acontecendo agora foi planejado em 1936; tudo o que o exército israelense faz, na verdade, é tirado daquele momento”, diz Jacir[iv].

Das tramas pessoais à luta coletiva

No filme, as tramas pessoais inicialmente desconexas começam a imbricar-se à medida em que vão sendo impactadas pela violência dos acontecimentos políticos sob o tacão da dupla colonização – britânica e, sua subsidiária, sionista. Ele atinge diferentemente cada personagem a depender da classe social e mesmo condição etária ou de gênero. Jacir nos apresenta tudo isso com maestria e beleza. E pitadas de humor – como quando um simpático secretário Hopkins ouve incrédulo as crianças dizerem-lhe que o jumento da aldeia se chama “Lord Balfour”.

Contra os processos burocráticos implementados pelo Mandato em favor do exclusivismo sionista, um grande movimento nacional vai se desenvolvendo. No campo e na cidade, palestinos organizam a resistência coletiva e unitária que eclodirá em princípios de 1936 e que produzirá novas lideranças, vindas do próprio povo – e não das elites tradicionais[v]. Um exemplo é o estivador Khaled (Saleh Bakri), que, da luta por salário decente no porto de Jaffa, engaja-se no combate anti-imperialista tornando-se um líder dos fedayin, os guerrilheiros palestinos.

O caráter da colonização palestina

As ameaças sofridas pelo povo palestino à soberania, à liberdade e ao acesso às suas terras compõem o contexto geral que colocará em movimento os eventos históricos retratados no filme. Mas para compreendê-los melhor, é útil voltar um pouco atrás e brevemente revisitar a formação político-econômica da Palestina até aquele momento.

Ao final da I GM, logo após a divisão entre França e Inglaterra do butim obtido do antigo império Otomano, a Liga das Nações, “concedeu” ao império britânico o “Mandato sobre a Palestina” por meio de uma resolução aprovada em 1920. De seus 28 artigos, os 7 mais importantes concerniam às obrigações dos ingleses em implementar os objetivos da Declaração Balfour ao movimento sionista: imigração ilimitada com garantias de cidadania a judeus trazidos pelas agências sionistas; facilitação legal a elas à compra de terras (algo antes dificílimo) e reconhecimento delas como representantes da comunidade judaica na Palestina, conferindo-lhes o direito de constituírem instituições próprias com poderes administrativos, judiciais, educacionais, diplomáticos e policiais sobre tal comunidade[vi].

Ou seja, o “Mandato” permitiu um governo (sionista) dentro de seu governo (britânico) e assim gerou o embrião do futuro Estado israelense. Não havia artigos, contudo, conferindo esses mesmos direitos institucionais de autogoverno, e muito menos de autodefesa, aos árabes-palestinos. De colônia de exploração do império Britânico, a Palestina foi sendo gradativamente transmutada pelos sionistas numa colônia de assentamento, algo já anacrônico e antiquado, mas nem por isso menos abrutalhado ou menos vinculado aos interesses do imperialismo. Após a criação de Israel, seu vínculo como “Estado cliente” com o imperialismo nunca deixou de existir. Manteve-se assim a serviço dos interesses políticos dos grandes capitais internacionais, apenas transitando de seu polo prioritário britânico ao francês (nos anos 1950) e finalmente (de 1967 em diante) ao norte-americano. É isso, muito mais do que a força de lobbies em si, o que explica o total e incondicional apoio financeiro, militar e diplomático que recebe de seus patronos.

A estrutura fundiária palestina

Desde fins do século XIX, o campesinato vinha sofrendo uma fragilização dentro da estrutura de classes da Palestina. Voltadas a incrementar a regulação administrativa e tributária, alterações na legislação fundiária introduzidas ao final do período otomano forçavam o registro privado das propriedades de terra. Camponeses resistiam em fazê-lo por temerem expor seus nomes a imposições escorchantes (tributárias, recrutamento militar etc.) das autoridades da Sublime Porta. Ao invés, portanto, viam-se empurrados a selar acordos – em geral não-escritos, mas sempre baseados em costumes culturais estabelecidos por tradições centenárias – com famílias nobres locais para que as mesmas assumissem o registro oficial da propriedade do imóvel rural. Assim, terras que haviam sido comunais por séculos e por incontáveis gerações de aldeões, tornaram-se propriedade privada de senhores feudais que nelas nunca haviam vivido. A posse das terras mantinha-se com os camponeses que nela seguiam trabalhando coletivamente, mas agora apenas na qualidade de arrendatários de “proprietários ausentes”[vii].

O Mandato Britânico alterara ainda mais o regramento de modo a facilitar a transferência de propriedade fundiária a estrangeiros e imigrantes. Com isso, as agências de colonização sionistas intensificaram a implementação de grandes projetos de aquisições de títulos de propriedade de terratenentes – em geral nobres, muitos que sequer moravam na Palestina.

Na região do Vale de Jezreel e da baía de Haifa – a fértil planície ao sul da Galileia -, por exemplo, apenas nos primeiros cinco anos do Mandato, as agências sionistas lograram finalmente adquirir 240 mil acres da família Sursok – grandes latifundiários e banqueiros de Beirute. Como tais compras eram parte central do projeto de criação de um Estado étnico-religioso excludente, o comando sionista imediatamente instalou colonos judeus recém-imigrados nas terras adquiridas e rejeitou terminantemente pedidos dos aldeões para seguirem usando-as, mesmo que compartilhadamente com os novos inquilinos. Assim, apenas neste caso, 8730 camponeses foram subitamente despejados de suas terras ancestrais[viii]. Transferências de propriedades (com subsequentes expulsões) do tipo intensificaram-se ainda mais no início dos anos 1930. Mais da metade das aquisições rurais pelos sionistas foram compradas de ilustres famílias feudais ligadas ao alto clero muçulmano, boa parte que sequer viviam na região.

Colonização sionista e imperialismo

Apenas em seus três primeiros anos no Alto Comissariado Britânico da Palestina, até 1935, o general Wauchope garantiu que as organizações sionistas dobrassem o número de colonos para 330 mil e quadruplicassem as aquisições de terras. Mesmo assim, os judeus não chegavam ainda a 17% da população palestina – e isso contando com judeus não-sionistas, em geral religiosos que já habitavam ali muito antes do sionismo. E as instituições sionistas, que oficialmente controlavam tal comunidade, registravam menos de 4% das propriedades de terra do país. Mais até do que tais estatísticas, entretanto, o mais insuportável e insustentável aos palestinos – quase 83% da população – era o desvelado respaldo britânico às ações de tais instituições em eliminá-los de seu próprio país por intermédio de um Estado étnico-exclusivista por elas explicitamente defendido.

Antes mesmo de conquistar o Oriente Médio dos otomanos, o governo britânico de coalisão (Liberais/Conservadores/Trabalhistas) de Lloyd George havia aprovado em 1917 uma Declaração apresentada por seu secretário de relações exteriores, Arthur Balfour, comprometendo-se frente à burguesia sionista judaica conceder um “lar nacional ao povo judeu na Palestina”. Não consultaram a população local, os árabe-palestinos, e nem tampouco as comunidades judaicas mundo afora sobre tal empreendimento.

Edwin Montagu, o único judeu no gabinete governamental, votou contra a Declaração. Ele, como parte considerável da comunidade judaica inglesa à época, era contra o projeto sionista. Em protesto, num memorando ao Gabinete, Montagu argumentou que tal projeto, além de levar à injusta “expulsão da população que já vive” [na Palestina], induziria o antissemitismo xenófobo na Europa: “Quando os judeus forem informados [por Lord Balfour] de que agora a Palestina é o seu lar, todos os países desejarão se livrar de seus cidadãos judeus. Os não-judeus da Palestina serão considerados estrangeiros [lá], da mesma forma que os judeus serão tratados como estrangeiros em todos os países” em que vivem e nasceram[ix].

O antissemitismo sionista de Balfour

Afinal, o sionista-cristão Balfour, quando primeiro-ministro, fizera aprovar em 1905, a legislação britânica mais antissemita do século. O “Aliens Act” visou barrar a imigração de milhões de fugitivos judeus pobres dos crescentemente violentos pogroms no leste europeu. O racismo inglês contra imigrantes juntava-se ao interesse em usar o projeto colonizador sionista (para dividir e reprimir o nacionalismo árabe anti-imperialista) como instrumento do imperialismo britânico. O interesse político-econômico deste último era controlar aquela região nevrálgica do Oriente Médio: corredor de passagem adjacente ao Canal de Suez que liga a Índia (sua principal colônia) e os poços petrolíferos do Iraque e Golfo Pérsico à Europa. “A classe dominante britânica não se importava com os judeus per se”, lembra o historiador palestino-americano R. Khalidi. Se não existisse o sionismo, “inventariam outro instrumento” para “satisfazer seus interesses estratégicos” na região[x]. Interesses exploratórios e opressores em qualquer caso. Algo que segue válido em nossos dias para explicar a essência do apoio dos EUA/Europa a Israel.

Enquanto as potências, como Reino Unido, França ou os EUA (a partir dos anos 1920) mantinham leis racistas anti-imigração às perseguidas e discriminadas massas judaicas, todos incentivavam o projeto de mandá-las (de vez) embora, para colonizar a Palestina. Assim, a partir de sua conquista do Mandato na Palestina, o governo britânico passou a dar todos os incentivos à entrada de novos colonos sionistas na Palestina, tornando-a um dos únicos destinos do mundo ainda abertos à imigração com direito à cidadania de judeus que procuravam fugir da perseguição na Europa.

Acordo com Hitler

Quando tomaram o poder, os nazistas ainda não haviam conseguido reunir apoio (popular interno e diplomático externo) para defender abertamente a expulsão em massa de judeus alemães do país. O sionismo lhes ajudou a resolver o problema. A Organização Sionista, orientada diretamente por Ben-Gurion (futuro primeiro-ministro de Israel), fez um acordo com o governo Hitler.

Conhecido como Ha’avará (“Transferência” em hebraico) e assinado em agosto de 1933, o acordo furava o promissor e crescente boicote internacional antinazista ao comércio com a Alemanha. Em troca do desmantelamento do boicote/bloqueio, Hitler permitiu que judeus levassem consigo seus bens, que haviam sido confiscados, ao emigrar, contanto que para a Palestina (e apenas a ela). E contanto que boa parte de tais recursos fossem entregues a agências e empresas sionistas na Palestina para importar produtos alemães. Cerca de 60 mil judeus alemães emigraram dessa forma à Palestina (boa parte às vésperas do início da Revolta).

Vale lembrar que o boicote internacional à Alemanha nazista fora impulsionado por, além de organizações comunitárias judaicas, centrais sindicais e partidos de esquerda em vários países. Deslanchado imediatamente após a posse de Hitler, em fins de janeiro de 1933, a campanha passou a reunir centenas de milhares em atos nos EUA e na Europa e era ajudado por ousados, mas efetivos, piquetes em portos e alfândegas. As exportações alemãs caíram 15% em 1933, com uma redução bem mais intensa no primeiro semestre. Isso tornou-se uma preocupação central ao recém-empossado governo nazista.

Com a Ha’avara, dirigentes sionistas (da “esquerda sionista”, como Ben-Gurion) comprometeram-se com os nazistas, na prática, em usar de sua autoridade política (junto a trabalhadores judeus ou não) para demover os apoiadores do boicote a suspendê-lo. Embora não o encerraram, enfraqueceram-no consideravelmente[xi]. Independente das intenções, objetivamente deram sua parte de contribuição na recuperação econômica alemã, a qual evitou o colapso nazista logo em seus primeiros anos no poder. Se tivesse de escolher entre duas alternativas: “salvar todas as crianças da Alemanha transportando-as para a Inglaterra, e apenas metade, transferindo-as para a Terra de Israel, eu escolheria a última”, explicava Ben-Gurion[xii].

Trabalhadores judeus e sionismo

Até o início do século XX, o sionismo não fazia sucesso entre judeus, fossem religiosos ou das massas trabalhadoras do leste europeu. Uma boa parte deles almejava viver em seus países (Polônia, Ucrânia, Hungria etc.) sem serem perseguidos ou oprimidos. Outra parte intencionava imigrar às Américas, Europa ocidental ou quaisquer países com melhores condições de emprego e de vida digna, com plenos direitos cidadãos e, portanto, livres de segregações étnico-religiosas. O sionismo, que vinha sendo patrocinado pelo imperialismo europeu, não atraía até então muito mais do que pequenos contingentes de judeus – além da grande burguesia judaica, que sempre procurava alinhar-se à política imperialista.

A bem da verdade, o sionismo ganha importância pela primeira vez não entre judeus. A religião e os costumes judaicos, aliás, sempre – por séculos – rejeitaram tanto a construção de um “Estado nacional” próprio na “Terra Santa”, quanto à colonização da Palestina. Tal ideologia surge durante a Reforma Protestante sob o manto do “Sionismo Cristão”, uma interpretação escatológica extrema, mas que passou a angariar popularidade dentre certas denominações evangélicas em vários países. Ela vai finalmente obter proeminência política, sobretudo entre segmentos das elites na Inglaterra e nos EUA, já na primeira metade do século XIX [xiii]. À medida em que servia de cobertura ideológica às aspirações imperialistas do grande capital europeu, tal sionismo foi se tornando política de Estado em algumas potências imperialistas. A elas o sionismo seria um instrumento tanto para resolver a “questão judaica” (enviando os indesejados judeus para fora da Europa) quanto à dominação da estratégica região do Oriente Médio – por meio de um empreendimento colonial patrocinado por capitais europeus, que levaria uma população de colonos (estranhos portanto à região) induzidos a dividir e reprimir o nacionalismo anti-imperialista (árabe) que ali surgia.

Foi só ao final do século XIX que segmentos judaicos – uma minoria composta por intelectuais e por representantes das elites bem articuladas – foram sendo ganhos ao projeto sionista; mas agora com um caráter secular e que mimetizava o nacionalismo burguês – reacionário e colonialista – das potências europeias.

O crescente antissemitismo, gerado pela exacerbação de tal nacionalismo em meio às tensões inter-imperialistas, junto com a forte propaganda desenvolvida pelas agências do sionismo judaico, permitiram-lhe, enfim, sair do isolamento para se tornar paulatinamente mais popular com o avançar das primeiras décadas do século XX. A forte intensificação do racismo e da intolerância contra judeus na Europa passou a ser devidamente canalizada pelo imperialismo britânico e pelas organizações sionistas, permitindo assim gerar um importante incremento na imigração judaica à Palestina em meados da década de 1930. Com ela, a ação sionista ali se tornou cada vez mais ousada contra os palestinos, o que gerava neles indignação crescente somada ao medo de se tornarem “estrangeiros em seu próprio país”[xiv].

As contradições de classe na sociedade palestina

Em sua concisa, mas seminal obra sobre o tema, o escritor e revolucionário palestino Ghassan Kanafani explica que, ao ter sido derrotado na “Revolução de 1936-1939”, o povo palestino enfrentara três inimigos[xv]. Além, obviamente, do imperialismo britânico e de seus sócios de colonização, os sionistas, as próprias classes dominantes palestinas e os regimes reacionários dos países árabes – subjugados ao imperialismo – jogavam contra a luta pela autodeterminação nacional[xvi].

As elites palestinas, ele aponta, eram compostas, de um lado, por uma “nascente burguesia compradora urbana, dependente de ligações não apenas com o imperialismo britânico, mas também com o movimento sionista que [importava capitais e] controlava a transformação industrial da economia palestina.”[xvii] De outro, continua, “os líderes feudais e clericais lutam [apenas] para melhorar sua posição dentro do regime colonial”. Embora “adotassem um programa progressista com consignas de massas, não desejavam nem eram capazes de levá-lo consequentemente até o fim. Não podiam tolerar a ascensão do movimento sindical árabe independente de seu controle”[xviii]. Assim, na década de 1930, “os capangas do Mufti [de Jerusalém, Amin al-Hussayni] assassinaram dirigentes da Associação dos Trabalhadores Árabes de Jaffa […] e de Haifa”.  A classe feudal-clerical “sentia seus interesses ameaçados [tanto] pela crescente força econômica [o capitalismo trazido pela burguesia judaico-sionista, aliado ao mandato britânico]”[xix], quanto “pelo lado oposto: as massas pobres árabes, que já não sabiam a quem seguir”.

E o filme de Annemarie Jacir expõe magistralmente esse drama resultante das contradições de classe. A disposição de luta revolucionária de Yussuf, Rabab e seus companheiros de aldeia e das massas camponesas e trabalhadoras é contraposta à pusilânime dubiedade de seu patrão, empresário da imprensa palestina de Jerusalém, sempre bem articulado com a alta administração do Mandato e procurando bons negócios com operadores sionistas. Embora tais “classes dominantes” procurassem um acordo com “os imperialistas britânicos [, estes] encontraram nos sionistas um aliado mais adequado”, conclui Kanafani[xx].

Pauperização e revolta

Sob patrocínio e proteção britânica, a ofensiva da colonização sionista operava em várias frentes, com a consolidação de instituições paraestatais que deixavam clara a intencionalidade da criação de um Estado etnocêntrico nas terras entre o rio Jordão e o mar Mediterrâneo. Por exemplo, a central sindical sionista, Histadrut (até hoje a central israelense), cumpriu um papel indispensável à divisão da classe trabalhadora, jogando seu componente judaico contra o árabe-palestino. A despeito de discurso pseudo-socialista, ela era essencialmente sionista. Reacionária e racista, ao invés de centrar sua atuação na luta por salários contra o patronato, dedicava-se à exigência para que este não empregasse trabalhadores árabes-palestinos, mas apenas “exclusivamente mão-de-obra judaica”. Demais instituições, que eram aceitas pelas autoridades britânicas, também tinham o mesmo propósito excluir e alienar a população nativa palestina.

Enquanto isso, dezenas de milhares de camponeses palestinos, ao serem despossuídos de suas terras no campo, eram empurrados à pauperização, passando a viver em cortiços e favelas em cidades como Jaffa, ou Haifa, onde se tornavam trabalhadores ultra explorados, frequentemente marginalizados e excluídos do mercado de trabalho. Somava-se a isso a crescente queda na renda líquida das massas palestinas. A Grande Depressão global dos anos 1930 derrubou fortemente os preços internacionais de commodities agrícolas. Despencaram assim as receitas de vendas da produção de quem vivia da terra, que representava à época quase dois terços da população árabe-palestina[xxi]. Quebras nas safras do início da década levou-os ainda a uma onda de endividamentos. O que acabou forçando partes significativas do campesinato palestino a perder suas terras. Nas cidades, caía também o poder de compra salarial, particularmente o dos mais discriminados e menos qualificados trabalhadores árabes recém expulsos do campo de uma forma ou de outra. Para piorar, a estrutura tributária foi se tornando mais regressiva, esmagando ainda a renda líquida efetiva da maioria empobrecida da população palestina. Tais fatores socioeconômicos foram catalizadores da agitação anticolonial que vinha fermentando já há anos[xxii].  

Greve Geral e Comissão Peel

Em 1936, como quase sempre, quem tomou a iniciativa de luta contra a insuportável política colonial foram trabalhadores e jovens urbanos, junto com camponeses. Convocaram a população árabe-palestina a uma greve geral, deflagrada em 20 de abril em Nablus e que, nas semanas seguintes, espalhou-se por todo o país. Formaram comitês locais que organizavam piquetes e fechamento de atividades comerciais, empresariais e de parte dos serviços públicos. Passeatas pacíficas ocorriam diariamente nas maiores cidades. No campo, os fellahin se organizavam – e procuravam se armar – para se defender das provocações, ataques e expulsões violentas de milícias sionistas e forças britânicas.

Com a crescente e espontânea adesão popular à greve, famílias influentes e líderes dos partidos das classes dominantes decidiram dar apoio ao movimento. Ao final do mês, sob a presidência do Mufti de Jerusalém, Amin al-Husseini, constituíram-se num Alto Comitê Árabe (ACA), que passaria a falar em nome do movimento[xxiii]. Demandavam ao Mandato a proibição da transferência de terras árabes aos sionistas e o fim da correlata política de imigração. Defendiam também a criação de um governo nacional palestino. Negociaram a suspensão da greve, que já durava um semestre, mediante a promessa dos britânicos em formar (como de costume) uma “Comissão” de inquérito. Chefiada por Lord Peel, ela concluiu seus trabalhos em julho de 1937 com recomendações inaceitáveis aos palestinos: entrega de 17% do país a um Estado sionista – de onde 200 mil árabes seriam “transferidos” (expulsos); o resto do território seria incorporado ao reino da Jordânia (regime fantoche sob comando britânico), ou mantido sob o Mandato.

Tal desaforo provocou a imediata retomada da luta popular palestina, que entra então numa fase de pesados confrontos armados. Enquanto lideranças, como os seguidores do pregador religioso e nacionalista Al-Qassam, mobilizavam e armavam a população no campo para combater o colonialismo, uma parte da direção do movimento – representando segmentos da burguesia urbana bem como os interesses do rei da Jordânia – defendeu aceitar a “oferta” de Peel, rompeu com o ACA e entrou em conflito com o mesmo. O Mufti e a maioria de seus membros, contudo, mantiveram-se com a rebelião. Disputas internas acabaram por atrapalhar a luta popular. Ainda assim, nos primeiros meses desta segunda fase da Revolta, “as forças britânicas perderam controle de várias áreas urbanas e muito das regiões rurais, que foram tomadas e passaram a ser governadas pelos rebeldes” palestinos; o que tornou “a administração civil do país quase inexistente”.[xxiv]

Repressão britânica e formação militar israelense

Foi necessário acionar todo o poderio militar do império britânico para derrotar a revolução anti-imperialista palestina e impedi-la de contaminar as massas árabes e as das demais colônias mundo afora. Um gigantesco esforço logístico era colocado em marcha: 100 mil soldados e 10 mil policiais foram deslocados da própria Grã-Bretanha “para salvar a Terra Santa”. A pressa para desencadear tal operação esteve dentre os motivos que apressaram Chamberlain a assinar o Acordo de Munique em setembro de 1938, com vergonhosas concessões a Hitler. Consentir inconteste com a invasão deste na Checoslováquia liberaria o imperialismo britânico de conflitos na Europa e lhe proveria tranquilidade à manutenção de tropas coloniais na proteção de seus domínios ultramarinos, sempre propensos a sublevações. E no caso particular da Palestina, permitiu ainda – com a anuência e colaboração nazista – o envio das próprias tropas metropolitanas inglesas a esmagar a revolução que ali se desenvolvia[xxv].

Vale notar ainda que o governo britânico preferiu não deslocar à Palestina os grandes contingentes indianos ou de outras grandes colônias, já que temia que fossem contaminados pela rebeldia local. Por isso, para elevar e completar suas forças repressoras, o governo integrou às suas próprias tropas outros 40 mil combatentes de milícias sionistas organizadas em várias “unidades militares auxiliares” e paramilitares, além dos destacamentos de “Polícia Supernumerária”.

Tais forças sionistas passaram agora a ser diretamente treinadas e armadas pelo comando militar britânico, algo obviamente proibido aos árabes-palestinos. Daí, aliás, adveio a facilidade na formação das instituições do Estado e das forças armadas de Israel (IDF), em maio de 1948. Destacamentos sionistas eram agrupados nas chamadas “Special Night Squads”, comandada pelo notório criminoso de guerra inglês, o capitão Orde Wingate (que é interpretado no filme por Robert Aramayo).

Condecorado ao final dos conflitos e promovido major-general, ele era um expert na doutrina britânica de contrainsurgência, calcada no brutal massacre de civis e na sempre desproporcional punição coletiva como estratégia para desmoralizar a resistência anticolonial[xxvi]. Dispunha em seu repertório de uma perversa variedade de instrumentos que ele fazia seus comandados aplicarem com destreza metódica: fuzilamentos sumários e públicos dos homens adultos de uma aldeia para forçar seus habitantes a “confessarem” onde (supostamente) estaria escondida uma arma ou um guerrilheiro (que muitas vezes sequer existia); aprisionamento de toda aldeia em um cercado a céu aberto e com privação de água e alimentos; explosão de inúmeras casas, escolas e edifícios nos bairros e/ou aldeias tidos como “focos de resistência”; queima das plantações e destruição das fontes de recursos econômicos dos aldeões.

Não é mera coincidência a semelhança de tal prática com a do Exército israelense (IDF), que repetiu tais métodos em 1948 (Nakba) e segue repetindo, agora com mais sofisticação tecnológica, nestes últimos dois anos em Gaza ou Cisjordânia. Dezenas de generais (incluindo chefes de estado-maior e ministros, como Moshe Dayan e Ygal Allon) e vários outros altos oficiais do futuro Exército israelense, criado em 1948, haviam sido treinados por Wingate[xxvii]. Sionista-cristão fervoroso, ele se tornou uma espécie de patrono oficioso do IDF, cuja doutrina – ainda que aprimorada – segue sendo a mesma até hoje.

A derrota e contrarrevolução e a internacionalização da luta

Com contingentes atingindo os 150 mil ao todo, as forças britânicas na Palestina dispunham assim de um combatente (altamente) armado para cada 3,5 homens adultos palestinos mal-armados ou (na maioria dos casos) desarmados. Ademais, aviões bombardeiros e tanques de última geração britânicos entraram ali em plena operação. Mesmo com tal parafernália bélica em plena ação, com o apoio de governos de países árabes vizinhos, e com as forças palestinas divididas e brigando entre si, foi necessário aos britânicos mais de um ano para que pudessem finalmente, em meados de 1939, neutralizarem a resistência palestina.

A derrota da revolução impôs um pesado revés à luta nacional palestina. Durante os 4 anos de luta, mais de 5 mil palestinos foram mortos e quase 16 mil feridos. Milhares foram presos e centenas exilados. Praticamente toda a liderança palestina, se não fora executada, acabou presa ou exilada. O povo todo foi desarmado e desmoralizado. Ao final, é verdade, a administração britânica acabou por fazer algumas concessões aos palestinos (restringindo – sem eliminar – imigração e transferências de terras aos sionistas judeus e aceitando a ideia de um Estado único, “a ser compartilhado” por ambos os povos). Tal resposta tinha menos a ver com sincero compromisso (muito menos arrependimento) do que com preocupação pela administração colonial em não gerar ódio exagerado contra si entre as populações árabes e muçulmanas. Afinal, parte das batalhas da II GM se dariam no Oriente Médio, e as forças britânicas precisavam evitar a desestabilização de regimes que o apoiavam.

Aos palestinos, o vácuo dirigente e organizativo foi catastrófico. Ele facilitou enormemente a ação das forças sionistas em 1948, que criaram o Estado de Israel e expulsaram mais de um milhão de palestinos entre 1948 e 1967. Estado que atua como guardião militar dos interesses do imperialismo na região e que se mantém, cada vez mais escancaradamente, por meio de um regime apartheid – encarcerando milhões de palestinos em bantustões (como na Cisjordânia) ou em campos de concentração (como Gaza).

Há um século atrás, os interesses imperialistas e suas contradições empurraram o povo palestino a uma injusta escalada opressora que era levada ao centro da política internacional. Hoje, mais até do que antes, as enormes mobilizações em todo o mundo em solidariedade à causa palestina empurram-na ao centro da luta internacional por justiça social. A defesa dos direitos do povo palestino é, mais do que nunca, parte essencial da defesa da humanidade.

*Alberto Handfas é professor do Departamento de Economia da Unifesp e presidente da Adunifesp.

Referência

Palestina 36

Direção: Annemarie Jacir
País: Palestina, Reino Unido, França, Dinamarca
Ano: 
2025
Duração: 119

Notas


[i] O filme está em exibição na 49ª Mostra de São Paulo e deve entrar em cartaz nos cinemas brasileiros.

[ii] A Nakba (“catástrofe” em árabe) foi a expulsão – entre novembro de 1947 e janeiro de 1949 – de cerca de 750 mil palestinos (quase 2/3 da população) de suas terras, vilas e cidades pelas forças militares sionistas enquanto criavam o Estado de Israel. Até 1953, mais algumas dezenas de milhares seguiram sendo expulsos. Em 1967, Israel aproveitou-se para expulsar mais 225 mil palestinos da Cisjordânia ao invadir militarmente Gaza, Cisjordânia, Golan e Sinai por meio de guerra iniciada por si mesmo. Essa nova onda de expulsão ficou conhecida pelos palestinos como Naksa (“revés” em árabe). O atual genocídio em Gaza e as violentas desapropriações na Cisjordânia são uma nova fase da mesma limpeza étnica iniciada em 1947 (cujo ensaio geral foi a própria repressão à Revolta 36-39), a qual nunca foi de fato encerrada por Israel.

[iii] The Guardian, 17/10/2025.

[iv] Idem.

[v] Khalidi, R. “The Hundred Years War on Palestine”, New York: Metropolitan Books, 2020. pp.42-44

[vi] Idem, p.35

[vii] Al-Salim, F. “Landed Property and Elite Conflict in Ottoman Tulkarm”, Jerusalem Quarterly, N.47, 2011.

[viii] Shaw Commission Report, 1930, p.118.

[ix] Pappé, I. “Lobbying for Zionism in Both Sides of the Atlantic”. Oneworld Publications, 2023 p. 63-4

[x] Khalidi, R., “The Neck and the Sword”. New Left Review, No 147, 2024

[xi] Greenstein, T., “Zionism During the Holocaust”, New Generation, 2022

[xii] Segev, T. “A State at Any Cost: the Life of David Ben-Gurion”.  New York: Farrar, Straus and Giroux, 2019.

[xiii] Pappé, I. op. cit. p.42

[xiv] Khalidi, op. cit. p.41.

[xv] Dirigente da FPLP (Frente Popular de Libertação da Palestina), Kanafani pôde apenas escrever a parte inicial de seu livro sobre “A Revolução de 36”. Antes de concluí-lo, ele foi assassinado em 1972 num atentado promovido pelo Mossad (serviço secreto israelense) em Beirute.

[xvi] Kanafani, G. “The Revolution of 1936-1939 in Palestine”, Ed. 1804 Books, 2023.

[xvii] Idem, p.33

[xviii] Ibidem, p.34

[xix] Ibidem, p.17.

[xx] Ibiden, p.16.

[xxi] Ibiden, p.20.

[xxii] Yazbak, M., “From Poverty to Revolt: Economic Factors in the Outbreak of the 1936 Rebellion in Palestine“. Middle Eastern Studdies. 2000, No 36 pp. 93-113

[xxiii] Khalidi, op. cit. p. 44.

[xxiv] Idem, p. 46

[xxv] A chancelaria alemã rejeitou os pedidos do Mufti Amin Husseini em conceder qualquer apoio financeiro/militar ao “Alto Comitê Árabe” durante a Revolta. O compromisso maior dos nazistas até a II GM era com a estabilidade das boas relações econômicas anglo-alemãs por meio do respeito aos interesses coloniais britânicos (Laurens, H. “La Question de Palestine” V. 2, Paris: Fayard 2002. pp.257-9). Ademais, o apoio a uma rebelião contra a imigração sionista seria contraditório com a prioridade nazista de expulsar os judeus da Europa (Nicosia, F., “Zionism and Anti-Semitism in Nazi Germany”. ‎ Cambridge University Press, 2008. pp 71-95).

[xxvi] Tal doutrina de contrainsurgência colonial fora desenvolvida em fins do século XIX pelo marechal Callwell e passou a ser cruelmente implementada em todas as colônias britânicas – da Irlanda à Índia, da África ao Oriente Médio. Seu livro, Small Wars, segue sendo referência básica às academias militares não apenas britânicas, mas dos EUA e de demais potências.

[xxvii] Khalidi, R., 2024. Op. cit.

Fonte: A Terra é Redonda

Deixe uma resposta