PF abriu inquérito, mas concluiu que o jornalista não cometeu crime, tendo apenas exercido o seu direito à liberdade de expressão

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou o jornalista Breno Altman pelo crime de racismo contra os judeus, além de incitação e apologia ao crime. O MPF acatou um pedido da Confederação Israelita do Brasil (CONIB), que afirmou, em notícia-crime, que postagens feitas pelo profissional em redes sociais eram racistas e antissemitas.

Anteriormente, a Polícia Federal abriu inquérito, mas concluiu que o jornalista não cometeu crime, tendo apenas exercido o seu direito à liberdade de expressão. A denúncia foi publicada nesta terça-feira (7), pelo procurador Maurício Fabretti, mesma data que marcou dois anos da ofensiva do Hamas e a escalada do massacre contra os palestinos.

Judeu, Breno Altman tem sido um dos mais duros críticos de Israel no conflito contra Gaza. Para o jornalista, o atual governo de Israel, liderado pelo premiê Benjamin Netanyahu, é movido por ideias racistas e impõe um regime de apartheid aos palestinos que vivem nos territórios que são controlados militarmente por Israel há anos.

O procurador Fabretti afirma ter identificado os delitos em postagens feitas por Altman no período entre 7 de outubro de 2023 e 1º de fevereiro deste ano. “Algumas dessas postagens, tomadas de forma isolada, aparentam ser apenas críticas a políticas do governo do Estado de Israel, mas, se inseridas no contexto formado por todas as manifestações do denunciado, revelam mal disfarçado discurso de ódio, configurador do delito do art. 20, § 2º, da Lei nº 7.716/89, e dos delitos de incitação e apologia a crimes, alternada ou cumulativamente”, diz a denúncia.

A CONIB afirma que as postagens “revelam nítida tentativa de defesa e normalização de atos terroristas praticados pelo Hamas”. A acusação menciona a definição de antissemitismo da Aliança para a Memória do Holocausto (IHRA), rechaçada em 1° de julho pelo Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), que publicou uma nota técnica manifestando sua veemente oposição à adoção do termo no país.

Na denúncia, Maurício Fabretti lista 12 publicações feitas pelo jornalista. Uma das postagens que foi considerada racista por Fabretti é do dia 12 de outubro de 2023. “Podemos não gostar do Hamas, discordando de suas políticas e métodos. Mas essa organização é parte decisiva da resistência palestina contra o Estado colonial de Israel. Relembrando o ditado chinês, nesse momento não importa a cor dos gatos, desde que eles cacem ratos”, publicou o jornalista. A Polícia Federal não viu crime no texto.

Breno Altman

Publicação citada na denúncia. (Foto: Reprodução)

O procurador também considerou que publicações feitas por Altman em 7 de outubro de 2023, dia do ataque do Hamas a Israel, se enquadram no delito de incitação e apologia de crime. “Não há um ‘conflito’ entre Israel e palestinos. O que existe é uma longa agressão colonial, diante da qual todas as formas de resistência são moralmente legítimas. Os ataques do Hamas têm natureza anticolonial. A reação sionista é o prolongamento de um crime”, publicou o jornalista na data.

Para Fabretti, o jornalista disseminou “discurso de ódio contra ao menos parte da comunidade judaica e com isso praticou, induziu e incitou a discriminação e o preconceito em relação a judeus, bem como incitou a prática de crimes contra eles e fez apologia de fatos criminosos e de autores de crimes.”

Defesa de Breno Altman

A defesa de Altman, representada pelo advogado Pedro Serrano, afirma que a denúncia do MPF é “uma vergonha institucional” e um “ato de racismo travestido de persecução penal”. A defesa classificou a denúncia oferecida por Maurício Fabretti como “ato de racismo travestido de persecução penal”.

Para o jurista e advogado Pedro Serrano, o promotor, ao pretender criminalizar as críticas e solidariedade de Altman, “transforma o direito penal em instrumento de censura política e de repressão ideológica, em afronta direta à Constituição e ao Estado Democrático de Direito”.

Serrado observou tratar-se de um “ato impregnado de racismo institucional e islamofobia, ao criminalizar o pensamento crítico e o direito de defesa do povo palestino, um povo submetido, há décadas, à ocupação, à segregação e ao extermínio”.

“O que se busca impor a Breno Altman é o silêncio pela força institucional do medo. É a tentativa de punir a palavra dissidente e de confundir, deliberadamente, antissionismo com antissemitismo, numa manobra intelectual desonesta”, disse.

Leia a nota da defesa:

“A denúncia oferecida pelo procurador Maurício Fabretti, do Ministério Público Federal, contra Breno Altman é um ato de racismo travestido de persecução penal. Ao pretender criminalizar as críticas ao governo de Israel e a solidariedade de Breno Altman ao povo palestino, o procurador transforma o direito penal em instrumento de censura política e de repressão ideológica, em afronta direta à Constituição e ao Estado Democrático de Direito.

Trata-se de um ato impregnado de racismo institucional e islamofobia, ao criminalizar o pensamento crítico e o direito de defesa do povo palestino, um povo submetido, há décadas, à ocupação, à segregação e ao extermínio.

Mesmo quem, como eu, se reconhece sionista — defensor da existência e da segurança do Estado de Israel — não pode compactuar com a perversão dessa ideia quando ela se converte em justificativa para o sacrifício do povo palestino. O sionismo, em seu sentido histórico, está ligado à autodeterminação e não à supremacia. É, portanto, em nome da própria tradição judaica que repudio o uso político do antissemitismo como instrumento de censura e silenciamento.

O que se busca impor a Breno Altman é o silêncio pela força institucional do medo. É a tentativa de punir a palavra dissidente e de confundir, deliberadamente, antissionismo com antissemitismo, numa manobra intelectual desonesta. Essa confusão não é ingenuidade: é fraude. E tem sido instrumentalizada pela CONIB para ludibriar o sistema de justiça brasileiro e calar as críticas legítimas ao Estado de Israel e à sua política de extermínio.

Posicionar-se de forma contrária ao sionismo político-militar — movimento que, à luz do pensamento de Hannah Arendt, Domenico Losurdo e Judith Butler, reproduz as estruturas de dominação, racialização e colonialismo herdadas da Europa moderna — não é incitar ódio, mas lutar pela concretização dos valores constitucionais que emergiram do pós-guerra: valores que repudiam a dominação e a violência de Estado.

Eu, como advogado, reafirmo: criticar o governo de Israel não é atacar o povo judeu. É, ao contrário, defender a humanidade que o próprio povo judeu ajudou a ensinar ao mundo. O maior inimigo do povo de Israel hoje é Benjamin Netanyahu e sua política genocida, que destrói vidas palestinas e corrompe os fundamentos morais e democráticos do próprio Estado israelense.

A denúncia do Ministério Público é uma vergonha institucional, prova de que o racismo também habita o aparelho de Estado, travestido de técnica jurídica. É um atentado contra a liberdade, contra a crítica e contra a própria inteligência da República.

Repudio com veemência a denúncia. Defender Breno Altman é defender a liberdade”

Fonte: ICL

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