Em junho passado, operações de fiscalização de trabalho análogo à escravidão realizadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego resgataram 24 trabalhadores de lavouras de café em três fazendas localizadas em Nova Resende, Juruaia e Areado, todos municípios do sul de Minas Gerais. As ações tiveram o apoio da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Ministério Público Federal e da Defensoria Pública da União.
Ao jornalista Leonardo Sakamoto, da agência Repórter Brasil, a equipe de fiscalização afirmou que a situação encontrada nas fazendas era “assustadora”. Relataram que em todos os casos constataram a ocorrência do crime de tráfico humano intermediados pelos chamados “gatos”, os contratantes da mão de obra terceirizada que vai servir os fazendeiros. A maioria dos casos de trabalho escravo no campo têm relação com a terceirização dos cargos.
Também apontam que os trabalhadores são seduzidos para o esquema com falsas promessas de bons pagamentos. No entanto, quando se veem presos ao local, encontram alojamentos precários e falta de luz e água, além da ausência de higiene nos banheiros e chuveiros.
Mas ao invés de ser aplaudida, a operação foi bastante criticada por Emidinho Madeira (PL-MG), um deputado federal bolsonarista. Em 18 de junho, logo que a notícia da operação se espalhou, ele foi à tribuna da Câmara e convocou o seu partido e a bancada ruralista para ajudá-lo a pautar uma mudança nas regras que regem as fiscalizações.
“Senhores auditores, a tinta da caneta, essa multa, é muito pesada e tira muita gente da atividade. Onde vocês passaram nessa semana, a colheita desse ano e do ano que vem dos pequenos produtores já estão comprometidas com a Justiça e o nome travado”, disse o deputado.
Emidinho Madeira pede a chamada “dupla visita”, que é quando a fiscalização primeiro orienta a fazenda a respeito da adequação às condições corretas de trabalho e só depois, num retorno, aplica as sanções – caso as irregularidades persistam. Esse tipo de fiscalização já é prevista em casos leves, o que não era o caso das três fazendas de café mineiras.
Além de pedir a padronização da “dupla visita” nas fiscalizações, o deputado também criticou o apoio dado ao MTE pela PF e pela PRF. Sobre essa última reivindicação do deputado, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho afirma que a apoio das polícias diz respeito à segurança dos servidores e não funciona como uma intimidação aos fiscalizados.
“A medida é necessária porque os casos de agressões, ameaças, intimidações e até assassinatos, infelizmente, são constantes”, diz a entidade.
Entidades de produtores rurais também repudiaram as declarações de Emidinho Madeira. Para o Polo Agroecológico do Sul e Sudoeste de Minas, a região “está em pânico” não por conta das fiscalizações, mas “pela quantidade de violações de direitos e pela existência de trabalhadores e trabalhadoras em condições análogas às escravidão na produção de café”.
Quem é Emidinho Madeira
Emídio Alves Madeira Júnior, o Emidinho Madeira, está na política desde 2015, quando assumiu seu primeiro mandato como deputado estadual após ser eleito com 66 mil votos. Em 2018 foi eleito deputado federal, e reeleito em 2022.
No último período destinou R$ 4 milhões em verbas oriundas do orçamento secreto de Jair Bolsonaro (PL). Também votou favorável a autonomia do Banco Central, a privatização dos Correios, a Reforma da Previdência e as PECs dos Precatórios e do Voto Impresso.
Mas sua vida política começou muito antes disso. Natural de Nova Resende (MG), a mesma cidade em que está uma das fazendas fiscalizadas pelo MTE, foi eleito presidente da Comissão de Cafeicultores do Sul e Sudoeste de MG em 2013. E foi defendendo o interesse desse setor específico do ruralismo brasileiro que foi ganhando notoriedade e cresceu politicamente até chegar à Câmara dos Deputados.
Seu pai, Emídio Alves Madeira, foi produtor rural e já esteve na chamada “lista suja do trabalho escravo”, organizada pelo MTE. Foram duas ocasiões, ambas em Bom Jesus da Penha (MG) mas em fazendas diferentes, segundo a Repórter Brasil. Na primeira ocasião, em 2016, 14 trabalhadores foram resgatados. Na segunda, em 2017, foram 60 resgates. Ele faleceu em 2021 vítima de Covid-19.
Fonte: Revista Fórum