A suspensão da reintegração de posse que aconteceria no último dia 22 de maio trouxe um alívio temporário para as famílias do acampamento Domingas, acompanhado há mais de 20 anos pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) no município de Porto de Pedras (AL).
No mesmo dia, a CPT realizou uma visita à ocupação para tranquilizar a comunidade, informando que o despejo não aconteceria de forma repentina. Carlos Lima, atualmente coordenador nacional da organização, explicou as medidas que estão sendo tomadas em articulação com o Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas (Iteral) e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) Nacional para assegurar a permanência das famílias e a regularização das terras ocupadas.
A determinação do desembargador Tutmés Airan a respeito da suspensão da reintegração de posse aconteceu após agravo de instrumento interposto pela CPT, representada pela Defensoria Pública, através do defensor Fernando Rebouças de Oliveira. O relator também designou uma audiência de conciliação entre as partes no próprio gabinete para o dia 06 de junho, às 13h. Essa reunião deve contar com a presença de representantes das famílias acampadas, da CPT, do Iteral e do Incra, além dos proprietários do “Recanto das Baianinhas”.
Entre os agricultores de Domingas está, por exemplo, o senhor Benedito Manoel dos Santos, cuja lavoura ocupa ao menos 3 hectares. “Eu planto banana comprida, inhame, macaxeira, batata, feijão de corda, jerimum, melancia… Tudo isso. Agora mesmo tenho 4 quilos de milho plantados para o São João. Tenho 700 pés de banana cacheando. Um cacho de banana dá mais ou menos 120 bananas. De lavoura, se eu sair daqui, perco em torno de R$35 mil. Eu vim para aqui para trabalhar, não vim para malandrar!”, disse.
A CPT segue ao lado das famílias camponesas de Domingas, reafirmando o compromisso com a defesa da reforma agrária e o direito à terra para quem produz alimentos saudáveis que garantem a preservação da vida.
Entenda o caso
O acampamento Domingas reúne 23 famílias que ocupam aproximadamente 40 hectares do imóvel denominado “Recanto das Baianinhas”, com total de 437 hectares, na zona rural do município situado no Litoral Norte de Alagoas.
A primeira determinação de reintegração de posse enfrentada pelas famílias camponesas acampadas aconteceu em 25 de maio de 2004, ou seja, há 20 anos. No ano seguinte, 2005, os agricultores e as agricultoras voltaram a ocupar a área, que estava abandonada, e seguiram com o trabalho nas suas roças. O processo de reintegração de posse do imóvel chegou a ser arquivado em 2010. Quase 10 anos depois, em 2019, houve um pedido de desarquivamento por parte dos proprietários da fazenda.
Diante disso, a Pastoral vinha articulando a desapropriação da área junto ao governo de Alagoas nos últimos anos, considerando que o Incra se encontrava inerte no que diz respeito às demandas da reforma agrária devido à gestão do governo federal naquele período estar sob comando de setores da extrema-direita, contrários à pauta.
Mas, em 12 de setembro de 2023, houve a fixação do prazo de 15 dias para a desocupação da área. Naquele período, a CPT, através da Defensoria Pública, solicitou que o caso passasse por uma audiência de mediação com a Comissão Regional de Soluções Fundiárias do Tribunal de Justiça de Alagoas. Assim, aquela reintegração de posse foi suspensa pelo magistrado no dia 04 de outubro até a manifestação da referida Comissão.
No dia 17 de novembro de 2023, a comunidade recebeu a visita técnica da Comissão Regional de Soluções Fundiárias do TJ-AL, após uma breve audiência com a presença do juiz José Eduardo Nobre, coordenador da equipe; do promotor de justiça do Ministério Público de Alagoas, Gustavo Arns da Silva Vasconcelos; da Defensora Pública, Dra. Rafaela Moreira Canuto; e de representantes do Iteral, do Incra, da CPT e do proprietário do imóvel rural em questão.
Na visita, a comissão verificou, por exemplo, que ao contrário do que os representantes dos proprietários informaram na audiência ocorrida naquela manhã, não existem apenas 3 famílias, mas sim 23 famílias na área que vivem em situação de vulnerabilidade social devido à ausência da reforma agrária. São 41 crianças e 5 idosos, sendo uma idosa cega e outro com deficiência auditiva, além de 3 terem doenças que exigem medicação controlada.
Também foi constatado que os agricultores e agricultoras que ali vivem produzem uma variedade de alimentos saudáveis que são destinados às merendas de escolas do município e do estado. Entre os alimentos, estão coco verde, laranja, banana, abacaxi, maracujá, macaxeira, inhame e abóbora. Há, ainda, animais como galinhas, porcos, bodes e cabras.
Entretanto, recentemente, a CPT foi surpreendida com a decisão determinando a desocupação da área para o dia 22 de maio de 2024, sem sequer ter um prazo recursal aberto.
A determinação teria ocorrido após uma audiência no dia 09 de fevereiro, mas a Defensoria Pública, responsável pela defesa da comunidade representada pela CPT, não foi intimada para participar.
Diante dos fatos, o desembargador Tutmés Airan de Albuquerque Melo determinou a imediata suspensão da ação de reintegração de posse até ulterior decisão e a audiência de conciliação.
Fonte: CPT Nacional