Natércia Lopes – Professora da Uneal e da Semed Maceió
Como se forma a/o professora/professor?
Para falar sobre formação docente na atualidade, ou sobre a construção do ser docente, como diz Chartier, é preciso falar sobre os Programas Institucionais de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) e Residência Pedagógica (RP).
O PIBID e a RP são programas importantes para iniciação à docência e têm aberto possibilidades e expectativas para várias/os alunas/os que, mantendo relações com a escola, acabam por terem um diferencial que aproxima a/o futura/o docente da Escola Pública. Essa relação acontece dialogicamente com as/os professoras/es que já estão atuando nas redes por oportunizarem troca de saberes e fazeres pedagógicos entre as licenciaturas e a sala de aula.
Ao explicar o processo de desconsideração deste governo com a formação de professoras/es, pauto a minha fala conjugada em duas partes para trazer algumas questões gerais e basilares referentes ao sentido da formação. Por isso, divido-a no percurso histórico da formação docente antes e depois de 2019. Ressaltando que, ao discutir sobre a formação docente, estamos de antemão, pensando para além dos cursos.
No século XIX tínhamos uma representação de ser docente ligada ao sacerdócio, não era nem necessário receber para tal, dar aula era dom divino, não necessitava de pagamento. Após anos de debates, e a representação da/o docente ideal como a da/o vocacionado sendo ultrapassada, surgem as discussões sobre a/o docente enquanto profissional e os saberes que ela/ele mobiliza para exercer sua profissão.
A maneira que ensinamos depende das/os alunas/os e sua família, do currículo prescrito, da disciplina, dos conhecimentos populares, das competências socioemocionais, do conhecimento específico, ou seja, a docência não é meramente técnica, não é só domínio de conteúdos, de metodologias, essa reflexão conduz a fala de Saviani sobre as práticas de ensino nas escolas.
Tardif vem colocar uma epistemologia do conhecimento pedagógico que circunda um conjunto de quatro saberes mobilizados ao ensinar. Para ele, nos tornamos professoras/es a partir do que aprendemos no fazer cotidiano de nossas atividades, sendo esses saberes fundamentais na formação inicial e continuada.
Durante os anos de 2002 a 2018, um considerável número de legislações favoráveis à formação de professoras/es foi sancionado, isso inclui o PIBID e a RP. Parecíamos que estávamos avançando para uma formação que considerava a criatividade, a investigação, e a reflexão, como pilares para a constituição da identidade profissional. As/Os professoras/es estavam sendo representadas/os por profissionais que produzem conhecimentos, produzem saberes, a partir de suas vivências em sala de aula, ou seja, existe produção específica de saberes no ofício da/o docente.
Contudo, em 2019, uma sequência de eventos catastróficos foram e estão sendo vivenciados na Educação, tais como resoluções com propostas educacionais que valorizam o modelo da racionalidade técnica e que consideram as/os sujeitas/os professoras/es como meras/os executoras/es de formulações e pensamentos de outros; além de atos e ações que não reconhecem a/o docente ou futura/o professora/professor enquanto profissionais que têm a capacidade de pensar, agir, tomar posições e produzir saberes.
O subfinanciamento, o desfinanciamento, e o atraso das bolsas do PIBID e RP, mostra a desconsideração do atual governo com a formação docente. Lembrando que é sobre a/o professora/professor que repousa todas as responsabilidades com o ensino e por isso, elas/es precisam ter uma formação inicial sólida e articulada com a formação continuada.
A democratização de ensino passa pela formação inicial e continuada e pela valorização das/os docentes. A docência é um campo específico de intervenção profissional na prática social, e isso nos convoca a responsabilidade de afirmar que não é qualquer um que pode ser professora/professor, é preciso mais que técnica, é preciso prática, pesquisa, intervenção, compartilhamento de saberes, conhecimentos experienciais, e competências socioemocionais.
Um governo que não valoriza a Educação, que suprime investimentos que são fundantes para a formação docente, que persegue professoras/es a partir de seu campo ideológico é um (des)governo que vai na contramão de todas as intervenções políticas e sociais que foram feitas deste o início da redemocratização do País.
Referências
CHARTIER, Anne-Marie. Escola, cultura e saberes. Conferência proferida na abertura do II Congresso Brasileiro de História da Educação. Natal, 2002, pp. 1-17.