Natércia Lopes – Matemática, Doutora em Ciências da Educação e Professora da UNEAL e Semed/Maceió
Você já parou para calcular quantas mulheres você conhece que são da grande área de ciências exatas?
Em meados da década de 90, os Estados Unidos enfrentavam uma escassez de profissionais qualificados em Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática. Aliado a isso, até o início do ano 2000, a avaliação do PISA (Programme for International Student Assessment) detectava baixo desempenho de estudantes na disciplina de Matemática, o que poderia implicar drasticamente a formação de novos profissionais.
A partir dessa realidade surgiu o Movimento STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics), que trazia elementos interdisciplinares e transversais para as áreas já mencionadas, que eram os pontos fracos das avaliações escolares. O Movimento STEM concilia as habilidades hards (específicas das disciplinas de exatas) e softs (trabalho em equipe, administração de tempo e comunicação), ou seja, alia a Tecnologia à Ciência, à Engenharia e à Matemática, e representa, por essa razão, uma transformação que poderia responder às mudanças socioeconômicas e tecnocientíficas.
Tal movimento só veio a ser conhecido no Brasil depois de quase 20 anos, com a promessa de romper com ensino tradicional e trazer inovação para as salas de aula. Logo após, acrescentaram a área de Arte ao acrônimo, para defender que haveria uma integração de todas as áreas através de projetos multidisciplinares e científicos. Como consequência disso, o que se iniciou como um movimento passou a ser a metodologia STEAM (Science, Tecnology, Enginnering, Art and Mathematics), em alguns países STHEM (Science, Tecnology, Humanity, Enginnering and Mathematics) ou STREM (Science, Tecnology, Reading, Enginnering and Mathematics).
O PNLD (Programa Nacional do Livro e do Material Didático) compreende ao STEAM como um potencializador para a integração entre todas as áreas do conhecimento no Ensino Médio. Desde então, a grande área de humanas acabou sendo inserida nesse núcleo duro das ciências, o que pode ser um equívoco conceitual se for levado em conta que todas as áreas e grandes áreas nascem de necessidades humanas, e que, diante disso, nunca devem ser descontextualizadas.
Deixando as variações acrográficas de lado, vale ressaltar o potencial do Movimento STEM para a inserção das mulheres nas ciências exatas.
O ensino e a aprendizagem da Matemática na Educação Básica brasileira enfrentam desafios para superar os baixos índices apontados por avaliações em alta e menor escala. A defasagem conteudista tem sido considerada um ciclo vicioso numa visão arcaica de escolarização que remete naturalmente ao fracasso escolar. Acompanhando esses fatores, jovens não tendem a buscar as carreiras em STEM na Educação Superior.
Pesquisas do IBRE/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas) de 2021 mostram que o percentual de jovens que buscam carreiras em STEM no Brasil é metade do observado nos Estados Unidos. Analisando a variável gênero, o número de mulheres representa apenas 26% dos trabalhadores formais nas áreas de Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática.
A explicação para a baixa adesão das mulheres às áreas de exatas relaciona-se ao processo de socialização. Mesmo a Ciência provando que não há correspondência entre sexo biológico e inteligência, o backfire effect de uma cultura falocêntrica arraigada na sociedade, insiste em dizer que a Matemática, por exemplo, não é área para mulheres.
O estímulo para a representatividade feminina nas áreas de STEM parte de uma mudança social. Essa transformação pode levar o computador, os jogos que desenvolvem habilidades de visão tridimensional, os brinquedos que focam a coordenação motora para criação de objetos, como o lego, para as prateleiras de meninos e meninas, como defende Debbie Sterling[1].
Órgãos e Instituições, públicas ou privadas, quando lançam editais de fomento às mulheres nas ciências têm como público-alvo quem já se encontra na Educação Superior. Para as alunas da Educação Básica, o que se vê são premiações pontuais sem expectativa de uma continuidade.
O Projeto de Lei Federal 398/2018, que altera a LDB 9394/1996, propõe estímulo à participação feminina nas áreas de STEM e a mitigação de barreiras contra mulheres nas ciências exatas em todo território nacional. No entanto, há 4 anos a proposta se arrasta em plenários sem previsão de promulgação.
Os problemas nas áreas de STEM carecem de sujeitos qualificados e empenhados na busca por possíveis soluções. A primeira fase do Censo Escolar 2020, divulgada pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), mostra que as mulheres são a maioria em todas etapas da Educação Básica e correspondem a 57,8% no Ensino Médio. Dessa maneira, é imprescindível a força dessas meninas/jovens/mulheres dentro das carreiras em STEM; assim como é indispensável a existência de políticas públicas em todas esferas do governo para incentivar a participação das mulheres nas ciências exatas.
[1] Engenheira e defensora das mulheres na área de STEM. Foi eleita a Pessoa do Momento da Time e uma das 30 Mulheres que Estão Mudando o Mundo do Business Insider.