Mineradora usa ação judicial de ato em 2021 para proibir manifestações contra ela em um raio de 10km

Lideranças políticas, religiosas e comunitárias foram intimadas na última semana pela Justiça estadual, em um processo que tem a Braskem como autora da ação judicial, para assinarem uma proposta de minuta abrindo mão de participar ou promover manifestações na capital alagoana, dentro do raio de 10 quilômetros das unidades da mineradora. A ação de Interdito Proibitório tramita na 29ª Vara Cível da Comarca de  Maceió.

Entre os processados estão o deputado estadual Ronaldo Medeiros (PT), o pastor Wellington Santos e o empresário Alexandre Sampaio, presidente da Associação dos Empreendedores Vítimas da Mineração em Maceió. Segundo eles, “a petição da mordaça”, como o documento sugerido está sendo chamado, é uma forma da empresa intimidar as lideranças e proibir qualquer forma de manifestação contra ela na cidade.

O documento versa sobre um temível Interdito Proibitório (esbulho, turbação, ameaça) dentro do processo que discute a legalidade de um ato inter-religioso realizado na porta da Braskem, no bairro do Pontal da Barra, em dezembro de 2021.

Em suas redes sociais, pastor Wellington Santos, líder religioso da Igreja Batista do Pinheiro, demonstrou surpresa ao receber a intimação. “É chocante ser intimado por quem vem causando destruição ambiental, humana e material, que colocou em ruína 20% da área urbana da cidade”, relatou.

Além do pastor, outros dois religiosos – Cônego Walfran e o Pai Célio – estão sendo processados e também foram notificados judicialmente. Todos estavam presentes na manifestação de quase três anos atrás, na porta da fábrica da Braskem.

16 SUICÍDIOS

Nas suas redes sociais, o pastor descreveu o protesto contra a mineradora como pacífico. “Nós realizamos um ato em dezembro de 2021, um protesto pacífico, interditamos as entradas da Braskem, porque queríamos nos manifestar, denunciar o crime. Colocamos uma urna funerária na porta, à época, para denunciar os 14 suicídios, que agora já são 16’”, enfatizou o pastor Wellington.

Para ele, a ação da Braskem é uma tentativa de silenciar e ameaçar representantes e moradores que sofrem com o desastre causado pela mineradora. “É um ato que ameaça sim, as ameaças e as intimidações judiciais são utilizadas pelos poderosos, silencia a imprensa, silencia ativistas. A Braskem diz que se sentiu ameaçada, olha que ironia”.

“Estávamos lá nesse ato, passamos o dia inteiro na porta da Braskem, no Pontal da Barra, em dezembro de 2021. Só saímos quando chegou uma liminar da Justiça, obrigando a gente desocupar o local. Daí então as lideranças que estiveram à frente da organização do ato estão sendo processadas pela Braskem”, relatou a bióloga Neirevane Nunes.

Representantes das vítimas dizem que proposta da empresa é “arapuca”

Segundo os líderes do movimento contra a mineração em  Maceió, as cláusulas dessa petição são abusivas e responsabilizam os signatários do documento pela realização de manifestações que atrapalhem a Braskem. Além disso, qualquer via fechada pelos manifestantes, a 10 quilômetros de distância de uma unidade da mineradora, para um protesto ou um ato público, estará proibida.

“Isso significa dizer que as vítimas e suas lideranças não podem fazer nada na cidade de  Maceió. Num raio de 10 quilômetros, se a gente for fazer um ato na Praça Centenário, atrapalha a Braskem. Se o protesto for na Ponta Verde, atrapalha a Braskem. Então fica praticamente inviável realizar qualquer manifestação em Maceió. Por isso, eu jamais assinaria uma petição dessa”, afirmou Alexandre Sampaio.

Segundo ele, a proposta desse documento “é uma armadilha”, basta traçar um raio de dez quilômetros, a partir da fábrica da Braskem no Pontal, na Zona Sul da capital. “Essa distância ridícula, imposta por essa petição, vai até o bairro de Ipioca ou até o Tabuleiro do Martins. Com isso, os movimentos sociais ficam praticamente proibidos de protestar contra a mineração na cidade de Maceió”, acrescentou.

Alexandre Sampaio é uma das lideranças que estão sendo processadas pela Braskem. Para Neirevane Nunes, que milita com ele na luta contra a mineração predatória em  Maceió, é como se em Alagoas a gente estivesse vivendo na época da ditadura militar. “Estamos sofrendo uma nova violência, as vítimas são tratadas como criminosas, enquanto a verdadeira criminosa permanece impune”.

DEPUTADO AMEAÇADO

O deputado estadual Ronaldo Medeiros (PT), ao final da sessão ordinária da última quinta-feira (20), confirmou ter recebido a intimação judicial sobre uma caminhada, em forma de protesto, realizada contra a mineradora Braskem. “Esta é uma empresa que maltrata e que destruiu vidas. Uma empresa que provocou o maior crime ambiental em área urbana e que agora resolve dizer que eu sou uma ameaça”, criticou o parlamentar.

Ele completou afirmando que, na verdade, quem representa uma ameaça é a mineradora. “Essa empresa destruiu uma parte de  Maceió e ainda hoje causa mortes, causa problemas psicológicos, psiquiátricos e de saúde nas pessoas que ali habitavam”, registrou o parlamentar, que é líder do governo na Assembleia.

OUTRO LADO

A reportagem da Tribuna Independente procurou a Braskem, por meio da sua assessoria de comunicação, para que ela explicasse qual a intenção da “minuta da mordaça”, mas não tive retorno.

A Braskem foi responsabilizada pelo afundamento de solo em cinco bairros de  Maceió, provocando o fechamento de 15 mil imóveis e a retirada de 60 mil pessoas de suas casas.

Fonte: Tribuna Hoje

Deixe uma resposta