Neste ano, 58,7% da população do país convive com insegurança alimentar em algum grau. São 125,2 milhões de brasileiros que ou não têm o que comer ou estão em risco de passar fome no próximo período. O país regrediu para um patamar tão ruim quanto o da década de 1990. É o que diz o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar (8/7/22).
Tal insegurança subiu 7,2% desde 2020 (e 60% desde 2018).
Há hoje 33,1 milhões de brasileiros, 15,5% da população, em condições de insegurança alimentar grave: aqueles que já não têm o que comer. Em 2013 tal contingente havia caído ao menor patamar: 4,2%. Com o desmonte das políticas públicas desde o golpe de 2016, mais de 25 milhões foram empurrados à fome, sendo 14 milhões apenas no último ano e meio.
Somente quatro em cada dez famílias têm acesso pleno à alimentação (“segurança alimentar”). As demais seis dividem-se numa escala que vai das que estão preocupadas com a eminente possibilidade de muito em breve não ter mais o que comer, passando pelos que não têm comida garantida todos os dias, até os que já passam fome.
Desemprego, informalidade e arrocho salarial
Os dados do IBGE ajudam a explicar tal quadro desesperador: de 2014 até 2019, cerca de quatro milhões de postos de trabalho formais (com carteira) haviam sido destruídos e substituídos por informais. No pico da pandemia, a situação piorou muito. A (medíocre) recuperação desde então permitiu apenas retomar o patamar de 2019.
Enquanto isso, há no momento 33,2 milhões de trabalhadores “subutilizados”. São todos sub ou desempregados que (na última semana) ou procuraram emprego e não acharam (14,8 mi), ou não puderam (por desalento ou outro motivo) procurar (11,4 mi), ou que querem emprego integral mas trabalham apenas meio período (sete milhões). Tais “subutilizados” – que também cresceram muito no auge da pandemia, recuando mais recentemente – mantêm-se no nível da média de 2017-2019. E são hoje quase 12 milhões a mais do que em 2014.
Tal quadro de desemprego, junto com a dificuldade em recuperação salarial e com a disparada da inflação, acumulada em quase 30% apenas durante o governo Bolsonaro, faz derreter a renda das famílias trabalhadoras – sobretudo as mais pobres. Os 5% da população com menor renda, por exemplo, tiveram queda de 34% no rendimento médio de 2020 para 2021.
Destruição de programas alimentares
O tenebroso retorno da fome é causado pela política criminosa de Bolsonaro, não apenas seus tetos de gasto e suas contrarreformas (trabalhista e previdenciária), que aumentaram o desemprego e a precarização. Mas também sua destruição dos programas de alimentação, abastecimento e auxílio à agricultura familiar (voltada à produção de comida ao povo) e de preços administrados.
O governo está desmantelando a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que regulava a distribuição de alimentos. Em 2019, Bolsonaro fechou 27 armazéns da Conab fazendo com que, por exemplo, o estoque de arroz caísse de mais de um milhão de toneladas em 2015 para apenas 22 (!) em 2020.
Agora ele abandonou o Programa de Aquisição de Alimentos (criado por Lula em 2003 e renomeado agora como “Alimenta Brasil”). Seu orçamento, que chegou a ter quase R$ 1 bi em 2012 não deve chegar a R$ 100 mil. O programa repassava verbas à Conab, estados e municípios para adquirir alimentos de pequenos agricultores e distribuí-los gratuitamente a creches escolas, Cadastro Único etc. O número de unidades recebedoras caiu de 17 mil em 2012 para 2,5 mil em 2020. E os fornecedores caíram de 129 a 31 mil.
Alberto Handfas
Fonte: O Trabalho