A cada dia que passa, a tensão aumenta na Europa em torno da questão da Ucrânia. Os Estados Unidos, seguidos pela Grã-Bretanha e vários outros países, evacuaram uma parte de seus funcionários diplomáticos do país e estão pedindo a todos os seus cidadãos que deixem a região imediatamente. Novos soldados estadunidenses, mas também de outros países europeus, foram enviados aos países que fazem fronteira com a Ucrânia.
Após as manobras na Bielorrússia, Putin organiza manobras marítimas no Mar de Azov e no Mar Negro. De todos os lados, tanto a Rússia como os Estados Unidos procuram demonstrar sua determinação. Putin continua dizendo que não quer invadir a Ucrânia e os Estados Unidos continuam dizendo que estão defendendo a Ucrânia.
Neste jogo político-militar de equilíbrio de poder, é o povo ucraniano que é feito refém, submetido a uma pressão permanente, a uma guerra de propaganda e, talvez amanhã, a uma guerra real.
Durante o colapso da URSS, cada uma das repúblicas se declarou independente sob a liderança de várias frações da burocracia do Kremlin. Essas frações da nomenklatura (a burocracia) recorreram ao nacionalismo para consolidar seu poder e não para garantir a soberania nacional. Porque, ao mesmo tempo, venderam a soberania nacional privatizando e abrindo as portas ao capital estrangeiro.
Burocracia stalinista e EUA compartilham divisão dos povos
O resultado foi o empobrecimento tanto na Ucrânia quanto na Rússia. Em dois anos, 600 mil ucranianos, a maioria jovens, deixaram seu país para trabalhar em diferentes países da União Europeia. É também o medo da mobilização popular na Rússia que leva Putin a recorrer ao nacionalismo russo em relação à Ucrânia para desviar a atenção dos povos da Federação Russa da imensa deterioração das condições de vida e trabalho.
A burocracia stalinista, que constantemente recorreu ao nacionalismo da Grande Rússia para melhor colocar os povos uns contra os outros, sob seu controle, é responsável, na origem, pelas divisões entre os povos. E esta responsabilidade ela partilha com o imperialismo dos Estados Unidos, que desde a dissolução da URSS tem procurado capturar, através da OTAN, as antigas repúblicas da ex-URSS.
Esta situação rompeu os laços históricos que existiam entre os povos desta região. Lembremos que antes da stalinização, a Revolução de Outubro havia libertado os povos do império czarista, descrito como a “prisão dos povos”. Ela estabeleceu a igualdade entre os povos do antigo império.
Por outro lado, Stálin e seus sucessores procuraram constantemente dividir, por exemplo, a Crimeia, que pertencia à República da Rússia, e havia sido transferida para a Ucrânia em 1954, por Kruschev. Obviamente isso não foi feito para satisfazer as aspirações nacionais do povo ucraniano, mas como parte do acerto de contas dentro da burocracia.
Pois, na sequência, a burocracia do Kremlin lançou uma severa repressão contra os tártaros da Crimeia, deportados por Stálin para o Leste russo no final da Segunda Guerra Mundial e que não puderam retornar à Crimeia até 1967.
Sob a mais pura inspiração stalinista, Putin fez o mesmo no leste da Ucrânia, onde as regiões de Donbass e Donetsk se declararam independentes. Neste oriente ucraniano vivem populações ucranianas, russófonas e russas, que foram divididas e colocadas umas contra as outras, enquanto por muito tempo elas tinham vivido juntas em fraternidade.
Nem o povo ucraniano nem o povo russo querem a guerra, e as populações de Donbass e Donetsk também não querem. Porque eles lembram as 13 mil mortes de ambos os lados entre 2014 e 2015. Não esqueçamos a longa história comum do povo ucraniano e do povo russo.
O primeiro império do czar foi fundado em Kiev no século 9, que tornou-se sua sede. Lembremos que os povos ucraniano e russo pagaram um alto preço na luta vitoriosa contra o nazismo. 25 milhões de cidadãos da URSS morreram durante a Segunda Guerra Mundial.
A liberdade e a soberania dos povos não devem ser buscadas nem do lado de Putin nem do lado dos Estados Unidos, mas no movimento dos povos para se libertar dos regimes opressores.
Lucien Gauthier
Fonte: O Trabalho