Luciana Caetano[1]

Dados extraídos do sítio da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN)[2], atualizados em fev/2021, revelam 4,7 mil devedores em todo o país inscritos na dívida ativa da União, totalizando R$ 2,6 trilhões. Constituído, majoritariamente, por dívidas de FGTS e previdência social, esse montante representa 58,5 vezes os R$ 44 bilhões prometidos às famílias em situação de vulnerabilidade social, a título de auxílio emergencial.

Analisando por outro ângulo, esses R$ 44 bilhões correspondem a apenas 1,7% do que é devido à União. Em outras palavras, se para cobrar a dívida da classe empresarial, a União se vestisse da mesma valentia que adota para destruir direitos trabalhistas, pagaria o auxílio emergencial e ainda sobraria dinheiro, se cobrasse pelo menos 2% da dívida ativa. Se fosse zerada, o governo reduziria à metade a dívida pública federal que já passa de R$ 5 trilhões.

A propósito, a PEC 186/19 prevê ainda lei complementar sobre a sustentabilidade da dívida pública como mais um gatilho à aplicação das mesmas restrições às custas do setor público, adicionando a venda de estatais para redução da dívida, que correspondia a 56,3% do PIB em 2014, conforme tabela 1, e já ultrapassa 80%, graças as promessas assentadas no receituário neoliberal, com dois claros propósitos – transferir ao setor privado o patrimônio público e desidratar o setor público, ignorando a insuficiência do salário mínimo como renda de acesso a bens a serviços essências à vida. O resultado desse modelo é uma população mais empobrecida e um recrudescimento das desigualdades sociais que alcançaram o nível mais baixo da história em 2014.

O bloqueio de concurso público e o congelamento de salários dos servidores públicos nas três esferas de governo, somados à reforma previdenciária, à reforma trabalhista e ao congelamento do gasto público até 2036 (PEC 95/2016) sinalizam com elevação do sucateamento do serviço público e precarização do trabalho em uma sociedade com grande parcela vivendo abaixo da linha da pobreza. Essa equação não pode dar certo, se o objetivo é a retomada de crescimento que carece de urgente redistribuição de renda para elevar a capacidade de consumo dos que compõem a base da pirâmide social. Até 2022, assistiremos perplexos a inclusão de outras pautas que sinalizam com o agravamento das condições de recuperação da economia, assim como maior concentração de

renda e desigualdade social, a exemplo da reforma administrativa e a política de privatização, que tem colocado nas mãos da iniciativa privada patrimônio que custou anos de endividamento público socializado com toda população brasileira. O processo de privatização do patrimônio público brasileiro, desde o governo de Fernando Collor de Melo, é um crime de lesa pátria.

Aproveito a oportunidade para sugerir, a quem interessar possa, consulta ao site da PGFN, onde é possível baixar arquivo dos devedores da União, por Unidade Federativa, com CNPJ, razão social, data de inscrição e origem da dívida. Essa dívida não inclui as contraídas com governos estaduais e municipais. À classe trabalhadora só restam duas saídas: estar bem informada e construir sólidas articulações políticas. À luta!!!

Fonte: Banco Central do Brasil, Nota técnica nº 47, 2018.


[1] Economista e professora da Universidade Federal de Alagoas.

[2] painel. MicroStrategy (fazenda.gov.br). Acesso em 13/03/2021.

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